Ao longo de duas semanas, a artista sérvio-holandesa Katarina Petrović desloca-se a Portugal para explorar a relação entre o céu e a terra, a arte e a ciência, a paisagem e os fenómenos naturais. Nos últimos anos, a sua pesquisa tem-se centrado em fenómenos como o Disco de Airy (Airy Disk). “Se nos dedicarmos a uma única disciplina, só à arte ou só à ciência, o conhecimento é incompleto”, considera Katarina Petrovic. É por esse motivo que, no seu trabalho, procura conciliar “várias áreas e estabelecer ligações entre elas”, como, por exemplo, entre arte e ciência. Além do Disco de Airy, Katarina assume também curiosidade em desenvolver trabalho acerca da chamada “luz verde”. Segundo explica, trata-se de um fenómeno que ocorre no momento do pôr do sol, em que, durante alguns segundos, se forma um círculo verde.

Segundo Bruno Ramos, coordenador da ADXTUR – Agência para o Desenvolvimento Turístico das Aldeias do Xisto, são vários os fatores que justificam a realização desta residência artística neste território. “Esta atitude de experimentação e de acolhimento artístico e científico faz parte da matriz das Aldeias do Xisto. Há muito tempo que sabemos que esta imersão é necessária para encontrar novos produtos, novos bens e novos caminhos de desenvolvimento”, começa por referir.

Também o tema a explorar neste projeto, “Habitar e mover-se em territórios de montanha”, vai ao encontro desta lógica de imersão. “É necessário um outro ritmo para que se perceba o que é a paisagem e o que é o território. Com a mecanização passámos a ter uma visão utilitarista da paisagem e defendemos que é preciso estar, ficar e caminhar para uma visão diferente”, acrescenta. O facto de as Aldeias do Xisto serem certificadas como Destino Turístico Starlight e o desenvolvimento de projetos nesse contexto que envolvem arte, ciência e pedagogia é mais um argumento a favor desta iniciativa.

“Aqui há uma atmosfera telúrica muito peculiar”, sublinha Rui Simão, vereador da Câmara Municipal de Pampilhosa da Serra. “Trazer o conhecimento científico para os nossos processos de procura de novos caminhos, mas também a sensibilidade dos artistas é uma forma de transformar o conhecimento em fenómenos sociais”, considera. Rui Simão sublinha ainda que ao juntarmos “arte, ciência e vivências locais, mostramos novos mundos a quem cá está e abrimos portas a outros que procuram o seu mundo”.

Também Carlos Casteleira, do PES, acredita que “a dimensão artística na ciência é imprescindível”, considerando mesmo que “sem a questão da sensibilidade, tão associada à arte, a ciência não é viável”. Trata-se, assim de uma “relação incontornável para o conhecimento”.

“Sendo um território UNESCO, o Estrela Geopark é um território de educação, ciência e cultura” e, por isso, a sua atuação “vai muito além da valorização das rochas”, explica Lucas César, do Estrela Geopark. Ao integrar este projeto, assume, assim a missão de “valorização da biodiversidade e das populações que ocuparam o território e que utilizaram a rocha como recurso e também o céu como território”.

Uma experiência simbiótica com os lugares

Esta iniciativa corresponde às duas primeiras fases de uma proposta do CAIRN - Centro de Arte Informal de Pesquisa sobre Natureza, um dos parceiros do projeto, e que prevê três momentos de trabalho.

Numa primeira fase, que acontece de 17 a 23 de julho, a artista instala-se na Aldeia do Xisto de Fajão, concelho de Pampilhosa da Serra, um dos melhores locais do mundo para observar o céu escuro e, por isso, certificado como Destino Turístico Starlight. Aqui, Katarina vai explorar as várias dimensões de um projeto que extravasa a mera observação para se assumir como uma aposta estratégica que concilia o desenvolvimento turístico, a integração com o sistema científico e tecnológico, a sustentabilidade social e ambiental, a capacitação das pessoas e o estímulo à economia.

Para isso, é convidada a conhecer os projetos em curso na aldeia e a visitar o PASO -Pampilhosa da Serra Space Observatory, um equipamento único no Hemisfério Norte que permite monitorizar detritos espaciais capazes de danificar satélites. A dimensão turística do projeto é dada a conhecer através de uma experiência de canoagem noturna, na Barragem de Santa Luzia, que inclui uma observação astronómica.

Das Aldeias do Xisto, Katarina Petrović segue para o Estrela Geopark, para explorar a Serra da Estrela e, em particular, a relação entre astronomia e a montanha mais alta de Portugal continental, patente inclusive na sua toponímia. Tem ainda a oportunidade de aceder e utilizar o Miradouro e Observatório Astronómico de Travancinha que, recentemente, recebeu novos equipamentos para uso de pesquisadores e visitantes.

Nesta região, a residência artística termina com uma caminhada, agendada para 29 de julho, para visitar os Pirilampos do Rossim, uma obra de Erik Samakh, que consiste na instalação de pequenos pontos de luz alimentados a energia solar, que, durante a noite, imitam o pulsar do pirilampo, criando lugares poéticos e proporcionando aos habitantes locais e visitantes uma experiência simbiótica com o meio envolvente.

A terceira e última parte desta residência termina já em 2024, em Digne-les-Bains, uma cidade no sul de França com forte presença do filósofo e astrónomo Pierre Gassendi. A convite do CAIRN, Katarina vai associar-se aos pesquisadores do Observatório de Saint Michel, onde, em 1995, se descobriu o primeiro exoplaneta.

Prevê-se que o trabalho desenvolvido nesta residência artística integre eventos em Castelo Branco e/ou Malpartida de Cáceres.