Bilhete-postal por Diana P.
Um dia, espero voltar cá com mais pormenores sobre a viagem a Marraquexe, com mais tempo, com fotos, contar-vos o lado belo da viagem, o lado que mostra o Instagram ou qualquer outra rede social. Mas hoje não é sobre este lado belo, não é sobre o incrível nem sobre o fantástico. Hoje quero contar-vos sobre aquilo que não gostei, sobre o lado ruim de viajar para um país tão diferente do nosso.
"Foi um choque, não vou negar"
Antes de mais dizer-vos que foi a minha primeira viagem fora da Europa. E logo Marrocos, um país tão culturalmente diferente. Antes de ir tentei informar-me, li testemunhos, dicas, etc. No fundo, antes de ir, quis preparar-me para o que iria viver, mas percebi que nenhum blog, por mais realista que seja, conseguiu preparar-me verdadeiramente. Foi um choque, não vou negar, e apesar de um lado meu ter gostado, sem dúvida que os museus, os jardins, os locais turísticos de Marraquexe são muito belos, um outro lado meu - e talvez o lado maior, que toda a gente sabe que não somos simetricamente concebidos - ficou aterrorizado com tudo o que viu e sentiu. Nenhum blog por mais realista que tentasse ser me conseguiu transmitir a intensidade dos cheiros e da quantidade de lixo que existe nesta cidade. Nenhum blog me conseguiu preparar realmente para a exploração animal que eu vi, para a falta de condições sanitárias a que assisti...
Para terem noção, eu vi fazerem cimento ao lado de uma padaria, com pão ao ar livre para venda imediata. Eu vi o pó do cimento a depositar-se em cima de todo aquele pão, que provavelmente era o mesmo que eu comia de manhã já que era das padarias mais próximas do meu riad. Eu vi formigas, num hotel bem luxuoso, a cirandarem em cima de tudo o que era para consumo do pequeno-almoço - do pão, das panquecas, das waffles, ..., das compotas. Em Roma, sê romano, dizem. Tentei abstrair-me e comi, não tinha grande opção e tinha fome. Tentei escolher produtos sem formigas de momento, e lá fiz a melhor seleção que consegui. Estou viva, aparentemente formigas não são venenosas ou nocivas para a saúde, e eu comi.
Não consegui, de todo identificar-me com a cultura, com a abordagem dos vendedores, com as motas e bicicletas a circular por entre os souks - mercados típicos - que mal tinham espaço para toda a gente que ali circulava, quanto mais para as carroças, motas e bicicletas que andavam por ali tranquilamente e sem grandes cuidados por entre as pessoas. Disto eu fui avisada, disseram-me que me davam um prémio se saísse de Marraquexe sem ser atropelada, e apesar de ter visto a minha vida negra em frações de segundos, por várias vezes, a verdade é que saí sã e salva daquela terra. Aguardo ainda o meu presente.
Nunca estive confortável, com exceção de quando estava num museu ou num jardim turístico. Fora desses sítios, e quem foi comigo ria muito, eu parecia uma múmia, tapada até aos olhos: Vestido até aos pés, lenço pelos ombros, chapéu na cabeça e óculos de sol - que eu não queria qualquer tipo de contacto visual com os comerciantes - fossem três da tarde ou duas da manhã.
No 3º dia - creio! - fomos a um local menos turístico beber uma bebida fresca e ver o fantástico pôr do sol de uma das praças mais famosas de Marraquexe, a Jemaa el-Fna, e digo-vos já que é realmente um dos pores do sol mais belos a que assisti. Bebemos tranquilamente, queríamos comer mas a parte do restaurante estava completa e na zona onde nos encontrávamos só serviam bebidas - não entendi, mas respeitei - e assim iniciamos o processo de saída do local para irmos jantar. E digo que iniciamos o processo de saída do local porque foi uma situação complicada que durou provavelmente - ou talvez só na minha cabeça - cerca de uma hora. Pedimos a conta e pedimos para pagar com multibanco. O que seria um processo fácil, não foi. Não tinham multibanco.
Burras!!! Burras, que nos esquecemos de perguntar se tinham multibanco. Ainda que durante toda a nossa estadia foi o único local - de restauração - que não tinha multibanco. Até os souks tinham multibanco!
Mas adiante.
Era necessário levantar dinheiro, e eu é que tinha o cartão. Disseram-nos que o multibanco era ali perto e eu desci à praça para tentar encontrar o dito.
No meio de toda esta confusão, alguém encontra alguma coisa? Não, esta vossa viajante não encontrou multibanco nenhum. Ora! Limitei-me a hiperventilar enquanto fugia com visão turva de todos os comerciantes, e vendedores ambulantes que tentaram impingir tudo e mais alguma coisa. Comecei a temer afastar-me demasiado do café e não conseguir encontrá-lo de volta - Marraquexe é labiríntico - até porque era Marrocos, não tinha dados móveis, ou rede, ou o que fosse, para tentar-me comunicar caso necessitasse. Com as pernas a tremer, com o coração a saltar-me do peito, com a visão totalmente desfocada - também poderia ser dos óculos escuros... - chego ao café a chorar, em pânico, que não encontrei o multibanco. Inicialmente, e como qualquer pessoa normal - teria de ir alguém normal, se não a viagem seria uma desgraça, não é verdade? - a pessoa que estava comigo pensou que me tivessem feito alguma coisa. Não, ninguém me tinha feito alguma coisa, mas na minha cabeça tinham-me feito tudo e mais alguma coisa - pensamentos limitantes, assumo a culpa.
Lá parei, respirei e contei o que tinha acontecido, ou seja, nada, mas que não tinha conseguido encontrar o multibanco. Pessoas normais e racionais pensam de forma, obviamente diferente, e a minha amiga lá foi pedir a alguém do café que a acompanhasse ao multibanco com a justificação de que se eu não encontrei provavelmente ela também não conseguiria encontrar. E lá foi um moço do café, com a minha amiga ao multibanco, e pronto acabou tudo em bem, tirando para o meu coração.
fizeram uma tatuagem de henna à força, e feia, o pior de tudo é que ainda por cima era feia!
Os restantes dias foram claramente condicionados pela experiência fantástica de estar sozinha nas ruas de Marraquexe e nada mais foi igual. Quem me segue no Instagram viu nas histórias que me fizeram uma tatuagem de henna à força, e feia, o pior de tudo é que ainda por cima era feia! Fiquei com uma pulseira à força, bebi chá berbere - incrivelmente delicioso - após quase ser empurrada para dentro de uma loja por um homem berbere que queria que eu comprasse mais de metade da loja, e eu com o peso na consciência da oferta do chá, lá comprei algumas coisas provavelmente mais caras do que compraria noutros locais...
E pronto, foi incrível... Foi incrível regressar! É inegável que eles têm coisas lindas, monumentos lindos, as cores são incríveis, o passeio à montanha foi incrível e também encontramos gente incrível pelo caminho, um dos senhores do nosso riad foi das pessoas mais gentis e pacientes que eu alguma vez conheci! No entanto, se alguma vez regressar será com um homem, de preferência com uma altura superior a 1,80m, com uma musculatura bem visível ou então com um grupo - acima de 4 pessoas está bom! - e de preferência que eu seja a única cagufas para que os outros me acalmem.
E é isto, não sei se já foram a Marrocos, se sentiram o que eu senti... Partilhem comigo. Se foram a outras viagens, a outros destinos, com histórias que vos fizeram tremer em mau, contem-me também, que é para eu riscar do meu globo.
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