O Porto nunca parece o mesmo aos olhos de quem o visita esporadicamente. Desta vez, porém, a novidade esperava-me logo à chegada, quando o autocarro da rede Expressos saiu da autoestrada e deteve-se imediatamente a seguir na entrada do Terminal Intermodal de Campanhã.
A minha curiosidade com o interface, inaugurado em julho do ano passado, despertou-me imediatamente da modorra de uma viagem de autocarro a meio da manhã. Não era motivo para menos. Tratava-se, afinal, de uma espécie de micro-celebridade urbana. À conta do seu público estudantil, o terminal foi, provavelmente, uma das obras arquitetónicas mais vezes referidas a nível nacional no Twitter no último ano.
Um espaço usado diariamente por milhares de pessoas com pressa para chegar a outro destino encontra-se sujeito inevitavelmente a comentários e críticas, umas mais justas que outras. Um ano depois de entrar em funcionamento, com a rotina mais oleada e já 2,5 milhões de passageiros ali transportados, a expetativa era grande para passar finalmente pela mais recente porta de entrada do Porto.
O entusiasmo esbarrou logo no acesso ao terminal, onde uma pequena fila de automóveis empatou por alguns momentos a viatura em que seguia. O motivo pode causar alguma perplexidade a quem está desejoso de completar uma viagem de longo curso: o parque de estacionamento público que ali existe partilha com os autocarros o mesmo acesso à gare. No meu caso, a espera não foi significativa, mas é fácil de imaginar o potencial de congestionamento em alturas de maior movimento.
O desencanto ganhou mais consistência pouco depois, ao perceber que teria de atravessar o enorme espaço do terminal para chegar ao WC mais próximo, no piso acima. Impulsivamente, e sem avistar uma passadeira, cortei a direito pela faixa de rodagem. Só mais tarde, ao observar outros a fazerem o mesmo, é que me apercebi como a passagem de pessoas à toa pelo meio de autocarros prestes a entrar em movimento deve deixar apreensivo, com razão, até o motorista mais cuidadoso.
O terminal é quase cavernoso em dimensão, mas parece sobrar, mesmo assim, pouco espaço para circular entre tanta gente à espera da sua viagem. A sinalética é pouco visível e os painéis informativos têm uma letra tão miúda (parece desnecessário anunciar que ainda não existe cais de embarque atribuída a viaturas com saída daí a 2 ou 3 horas) que, por vezes, formam os seus próprios congestionamentos, à medida que são rodeados por grupos de passageiros à procura de informações.
O piso superior, ao mesmo nível que a rua, é mais agradável e convidativo para quem ainda tem uma longa espera pela frente, mas está estranhamente reduzido a um corredor, sem bancos para nos sentarmos que permitam usufruir do verde que já vai surgindo em redor do edifício. As casas de banho (gratuitas, note-se) oferecem uma visão panorâmica do espaço interior, mas apenas duas cabines sanitárias, uma das quais avariada naquele dia.
Em suma, o terminal ganhou uma localização melhor e mais espaçosa que as antigas instalações no Campo 24 de Agosto, que cumpre o grande objetivo de remover dezenas de autocarros do centro da cidade. Ao mesmo tempo, a sua configuração atual fica aquém das expetativas de quem esperava encontrar um terminal moderno, onde o conforto e a acessibilidade estivessem mais em destaque e pudessem servir de inspiração a outras instalações similares espalhadas pelo país.
No topo dessa lista estão, claro, os terminais rodoviários de Lisboa, que já oferecem ligações ao metro e comboio, mas pouco mais em termos de comodidades. Em Sete Rios, a gare é possivelmente um dos espaços públicos da cidade com a pior qualidade de ar, devido ao fraco arejamento dos fumos gerados pelas viaturas. Esperar no exterior, infelizmente, não é muito melhor, dada a quantidade de fumadores que aproveita para fumar ali o último cigarro antes de seguir viagem.
Neste ponto, a vastidão de Campanhã joga a seu favor. A atmosfera é mais arejada, ainda que seja fácil passar pela nuvem deixada por um fumador. A limitação do consumo de tabaco a áreas específicas dos grandes interfaces de transportes tarda em chegar a Portugal, mas faria uma grande diferença no sentido de tornar estes espaços mais respiráveis.
O panorama deprimente dos terminais rodoviários em Portugal torna difícil apontar falhas a Campanhã, e à sua intenção de reduzir o congestionamento e a poluição no centro do Porto. É possível que ajustes futuros permitam atenuar ou resolver os reparos aqui apontados (e neste artigo do JornalismoPortoNet, que só li já depois de escrever este texto). Em 2019 (sem os efeitos da pandemia), os serviços rodoviários nacionais transportaram mais de 6,6 milhões de passageiros. É um valor que sublinha a importância de continuar a fazer do transporte rodoviário de longo curso uma opção mais acessível e confortável.
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