Reportagem por Mário Pedro Caetano (LUSA)
Afonso Carvalhais tem 18 anos. Desenvolveu a paixão pela guitarra portuguesa durante a pandemia, e foi a “sonoridade única” do instrumento que lhe despertou a vontade de tocar.
Carvalhais é um dos novos guitarristas assíduos na Tasca do Jaime, casa que lhe abriu as portas, e lhe deu a oportunidade de tocar e aprender ao lado de mestres, com a primeira guitarra oferecida pela mãe.
Começou a aprender música “no piano”, mas os filmes antigos de Vasco Santana foram os cúmplices que o puxaram para o som da guitarra portuguesa, com referências a intérpretes históricos como Carlos Paredes, Alcino Frazão e Zé Pracana.
Dona Laura Nunes, a “Margaret Thatcher da Tasca”, como Jaime se refere à dona da casa, é quem garante o espaço aos jovens artistas que aparecem no Fado Vadio.
Laura entende que tem o “dever de dar oportunidade” aos mais novos, e aponta com orgulho o exemplo dos guitarristas Daniel Freire e Afonso.
A empresária enaltece a “grande experiência” de trabalhar com jovens, além de a agradecer, porque também é mãe.
Daniel Freire tem 17 anos, começou a tocar guitarra portuguesa aos 10 anos por influência da família, sente as letras e tenta dar o espírito que lhes corresponde, sem conseguir explicar “algo que vem de dentro”.
Ao longo da noite, os jovens artistas puxam pela voz e pelas guitarras para receberem o agradecimento do público, a maioria estrangeiros que, sem perceberem a língua, demonstram satisfação em aplausos e nos olhares que dirigem aos fadistas.
Eduardo Batista completa 19 anos e começou a cantar aos oito, por herança do avô. O fadista defende que a sonoridade do fado é inigualável e “toca a alma” de qualquer pessoa, mesmo aos estrangeiros, porque a “guitarra toca em qualquer coração”, indiferente à língua.
Toda a intensidade colocada no fado é “trespassada” para todas as linguagens, só existe nesta maneira de cantar, e em Portugal, sendo a música que mais lhe toca a alma, precisa Eduardo Batista à agência Lusa.
Outra figura incontornável das violas de Lisboa é o "Dr. Heleno", como os jovens artistas chamam ao médico reformado, a quem o “amor” pelo fado, como era tocado há 50 anos, o leva a Alfama acompanhar os jovens artistas.
O médico Fernando Heleno, com a sua viola, assume ser o “travão” e o “equilíbrio da malta mais nova”, porque eles “trazem outras ideias” e podem desvirtuar a essência do “Velho Fado”, de que é defensor.
'O viola' argumenta que o fado tem uma “forma própria”, e os mais novos estão ainda um “bocado à deriva”, devido à pouca experiência que ainda têm.
Carolina Gomes, de 19 anos, despertou a sua paixão pelo fado durante uma homenagem à irmã, que morreu precocemente. Quando cantaram um fado em sua memória, foi aí que percebeu a essência desta música e deste canto.
Na altura, optou entre a natação e uma escola de fado, para tirar os “primeiros tons”, e hoje é uma das vozes mais aplaudidas por Alfama.
A fadista começou nas casas de fado e nas tascas, por serem as portas de entrada de eleição a quem “quer esta vida”, disse Carolina à Lusa, com um sorriso nos lábios e os olhos brilhantes.
As tascas de Alfama ainda “recuperam” da pandemia, sem saber o futuro do negócio ou do turismo, enquadrou Jaime Nunes frente à Tasca antes de a noite de fados começar.
A paragem fez com que as gavetas das registadoras tivessem ficado vazias, “sem moedas para a 'bucha'”, mas valoriza o facto de estarem vivos. E a paixão pelo Fado Vadio faz ultrapassar qualquer dificuldade ou pandemia.
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