O relógio do aeroporto do Porto indica que são 06 horas da manhã. A ansiedade de saber se chegam a tempo de entrar no avião entorpece a consciência. "A Ryanair bem que podia ter voos a saírem um pouco mais tarde", pensou João, mas "assim tinha menos tempo para aproveitar no destino", o sul de Itália, consertou o pensamento logo de seguida.

Atrás, correm Ana, mãe, Estela e Amélia, filhas com menos de seis anos. As poucas horas de sono fazem delas passageiras lentas, as mais lentas daquele aeroporto, que naquele dia nem estava cheio. Era julho de 2022. "As pessoas ainda não se livraram do medo da covid-19?", pergunta a mãe, já sentada no banco da zona de embarque, enquanto come um pão misto. As filhas pedem um pouco do seu, enquanto brincam com a mala pequena que vai para debaixo do assento da frente, regras da companhia aérea, isto depois de ter colocado uma mala grande no balcão. Vinte quilos com roupa, cremes, fraldas e chinelos.

Dentro do avião, tudo normal. A viagem para Bari, capital da Puglia, não dura mais do que duas horas e meia e corre tudo bem. Elas, as crianças, portam-se bem, mas ninguém dorme.

No aeroporto de Bari entram num táxi que os levará até à cidade onde lhes espera um carro. Fica a 50 quilómetros. A guerra na Ucrânia fez disparar os preços e este, em Adelfia, era o mais económico para os 11 dias de férias: 280€ cobrados por uma empresa local chamada Byron contra os 670€ que seria o aluguer no aeroporto de Bari. Aqui ninguém fala em inglês e o conhecimento de italiano da família é pouco para uma conversa de entendimento. A família achou que os 45€ pelo serviço de táxi que a empresa local pedia era muito, mas tinha acabado de pagar 55€ no táxi regular do aeroporto, uma tarifa pré-estabelecida. Más escolhas não podem atrapalhar as férias.

Onde comer em Matera: Il Terrazzino, Pizeria Austin, Osteria L'Arco e Ristorante da Nico

Alojamento: Cinque Elementi

Família toda no carro, cadeiras de automóvel levadas de Portugal para poupar nos gastos, em direção a Matera. São poucos os lugares que parecem irreais, este é um deles. Escondido entre um emaranhado de ruas, ruelas e edifícios de betão, eis que aparece, lá ao fundo, um bolo de noiva acastanhado, é o centro histórico desta cidade. Este lugar ficou ainda mais popular depois de aparecer na sequência inicial do mais recente filme do 007, Sem Tempo para Morrer, e a verdade é que não poderia haver melhor arranque de férias para esta família portuguesa. Pizas para todos na primeira refeição, calcorrear pelas ruas, procurar frinchas para as melhores vistas (e melhores fotos), provar o famoso e regional cime di rapa. Estela e Amélia ficam encantadas por dormir, pela primeira vez, numa gruta, ainda por cima com um jacuzi com espaço para toda a família.

Deixa-se para trás a região de Basilicata e é hora de entrar na região da Puglia, o tacão da bota italiana. Sabem o que é uma masseria? São antigas quintas, agora transformadas em bonitos alojamentos, mantendo a essência pugliese. Em Porto Cesareo é hora de começar a diversão com areia e água salgada.

Onde comer e dormir em Porto Cesareo: Masseria Zanzara Hotel & Ristorante

Punta Prosciutto, Torre Lapillo, Santa Caterina di Nardó e Torre San Giovanni foram as praias visitadas, agora penduradas lá em casa, dentro de fotografias. A praia de Santa Caterina di Nardó, de areal curto, apresenta um anexo peculiar: uma mini praia escondida entre as rochas, como se de uma tenda se tratasse. Os pais ficaram mais entusiasmados do que as crianças, até porque dava uma boa foto para o Instagram, não tanto para o mural lá do apartamento.

Há famílias que vão de férias para descansar. Claramente, esta não é uma delas, porque só se passaram três dias e já estão na estrada de novo para mudar de alojamento, desta vez para Otranto. Os cenários campestres ficam para trás, chegam as paisagens mais urbanas, mas sem exageros. Antes, uma paragem para conhecer a cidade, esta sim grande, de Lecce, para visitar o centro histórico e almoçar, mais uma vez, piza. 50% das refeições de Estela e Amélia foi à base de margaritas, a preferida delas. Aqui também se compraram massas e temperos para reproduzir as refeições italianas em Portugal.

Onde comer em Otranto: Gelateria Cavour e Ristorante Al Tartufo

Alojamento: Hotel La Plancia

Em Otranto, o hotel é pequeno, acolhedor e em frente a uma praia, igualmente pequena. Ana e João querem mais, tudo o que veem é tão bonito que querem tudo em todo o lado ao mesmo tempo. Alimini e Due Sorelle são praias mais agitadas do que as que estavam do outro lado do tacão da bota, mesmo assim, quando chegam a casa não deixam de as recomendar aos amigos, que iam ficando fascinados com o que viam nas redes sociais do lado de cá. O verdadeiro encanto, porém, estava mesmo em Otranto. A sua pequena praia, citadina, tinha um encanto sem igual, com o centro histórico a espreitar um mar azul, tão azul que tinha de ser partilhado.

- Não entendo quem viaja 8 horas de avião para passar férias nas Caraíbas quando existe este mar na Europa. Desabafa João nas redes sociais.

Já ouviram falar da Gruta da Poesia? Podia ser o título de um romance de verão, mas é uma formação rochosa com recheio de água salgada e verde-esmeralda. Não acreditam? Tentem encontrar na fotogaleria abaixo e depois regressamos à história.

O quê? Que porcaria de fotos! Má qualidade! Isto são fotografias captadas com uma máquina fotográfica analógica descartável, comprada uns dias antes na FNAC do Braga Parque. Ana percebe que João está farto de imagens perfeitas do Instagram, dos julgamentos no Facebook e do ódio gratuito no Twitter. Que tal fazer uma viagem no tempo e experimentar, nem que seja uma vez, a sensação da fotografia analógica dos anos 80/90? Foi o que eles fizeram - claro que não dispensaram o plano B do telemóvel - e a verdade é que a excitação pelo disparo único e surpresa na revelação do filme é ímpar. Ora aqui está uma experiência para fazer uma vez na vida durante as férias. Fica lançado o desafio.

Onde estávamos? Ah, a Grotta della Poesia, entre Otranto e o próximo alojamento, Monopoli. Um lugar para corajosos. Aqui o desafio passa por saltar os quatro metros em direção à água. Ninguém saltou. Digo, da família, porque foram muitos os desconhecidos que saltaram, em bomba ou mergulho. Ana foi para a fila mas de lá não saiu, nem o incentivo do público a fez mover os pés. "Não se pode pensar muito", diz ao marido, que se escondia por detrás da desculpa "alguém tem de tomar conta das miúdas" para disfarçar o medo. Mentira, ela sabe que ele não gosta destas coisas. A água era mais fria do que o habitual, mas ainda deu para um banho rápido entre pequenas rochas.

Onde comer em Ostuni: Ristorante La Reggia e, um pouco mais afastado, em Monopoli, fazer uma degustação no Sorelle Barnaba Country House.

Alojamento: Sorelle Barnaba Country House, Monopoli

É hora da última paragem. E que bela forma de começar o final das férias, com Alberobello, Monopoli, Ostuni, Poligano a Mare. Cada sítio parecia mais bonito do que o anterior. Ana, João, Estela e Amélia não podiam estar mais felizes, a dormir todos juntos num Agriturismo com piscina, comida local, degustação de azeites... Tudo parecia perfeito. Ponto. Não há lugar para um "até que" ou "mas". Esta família sabe, cada um à sua maneira, que estas foram as melhores férias de sempre.

Spritz, taralli, orecchiette & amore. Viram eles escrito na capa de um caderno exposto na loja de souvenirs no aeroporto de Bari. Não trouxeram. Nas páginas não caberiam todas estas histórias de quem vai, não fica, mas vive lá para sempre.

Spritz, taralli, orecchiette & amore
créditos: Volto JÁ | SAPO Viagens