Partimos ainda de madrugada pela estrada de Abra Málaga, uma passagem montanhosa e íngreme, localizada no sopé da montanha nevada Verônica, na província de Urubamba, Ollantaytambo, rumo a um miradouro para apreciar a paisagem majestosa que se impõe ao nosso redor e que nos faz sentir pequenos face à sua grandiosidade.
Se chegarmos antes do amanhecer, conseguimos ver os glaciares e ainda desfrutar do nascer do sol, porém, não serão essas as únicas surpresas. Junto ao miradouro, inserido na área de reserva Abra Malaga Thastayoc, e a 4400 mil metros de altitude, comunidades indígenas das redondezas estão a plantar árvores nativas (polylepis) para recuperar a floresta vítima do desmatamento.
Acabamos por não ver os glaciares – chegámos já após o nascer do sol –, contudo, o cenário que se apresenta é de nos deixar de queixo caído: do nosso lado, na reserva protegida de Abra Malaga Thastayoc, polylepis salpicam de verde a paisagem dominada pelos tons amarelados e castanhos da cadeia montanhosa. À nossa frente, após atravessarmos o estreito vale com o olhar, nuvens cobrem os picos montanhosos, escondendo os glaciares. Ali, do outro lado, o cenário parece mais árido, mas ainda assim magnífico – não fosse tudo obra da mãe da natureza.
Caminhamos por um trilho entre as polylepis que se erguem entre o musgo amarelado. Aqui, a paisagem parece saída de um cenário do “Senhor dos Anéis” – ou do "Hobbit" – devido ao seu encanto e ao lado místico que inspira.
Connosco, encontra-se Constantino Aucca Chustas, presidente da Associação de Ecossistemas Andinos (ECOAN) e do Moviemento Acción Andina. Constantino, também conhecido por Tino e "Campeão da Terra", tem dedicado a sua vida à conservação das florestas da América do Sul, peças chave no combate às alterações climáticas e lares de espécies únicas tanto de fauna como de flora.
Áreas dos Andes como a que o SAPO Viagens visitou já foram cobertas por polylepis, contudo, segundo as Nações Unidas, atualmente, apenas 500 mil hectares permanecem de pé. Face a esta realidade, a ECOAN e a Acción Andina procuram restaurar e proteger estas florestas de altitude e, para tal, contam com a colaboração das comunidades indígenas que ajudam não só a plantar, como a preservar. Em troca, a ECOAN ajuda estas comunidades (quase invisíveis), a legalizar as suas terras, o que as protege da exploração por empresas madeireiras, mineiras ou petrolíferas, assim como a ter acesso a medicamentos, entre outros bens essenciais e a ter oportunidade de melhorar infraestruturas nas suas aldeias.
Mas como tudo isto se processa?
Para melhor entendermos, visitámos dois berçários de árvores em Patacancha, ambos geridos por comunidades indígenas locais.
"Normalmente, uma comunidade tem mais de 150 pessoas", explica Tino, acrescentando que Patacancha é uma das maiores com 800 habitantes e que, por isso, tem um dos maiores viveiros do programa. "A capacidade é superior a 75 mil mudas", partilha. "Aqui são produzidas três espécies de polylepis".
Com "falta de verba" e para conseguir reflorestar os Andes, a ECOAN e a Acción Andina estabelecem parcerias com outras entidades que partilham os mesmos propósitos e valores.
Em Patacancha, a ECOAN e a Accion Andina trabalham com a TUI Forest, que já criou no total 19 viveiros para as comunidades indígenas na cordilheira de Vilcanota.
"Colocamos as mudas no final ou durante a estação chuvosa, que é entre dezembro e março", descreve o presidente da ECOAN. "Simultaneamente, os membros da comunidade começam a cortar as partes que servirão para produzir novas árvores. Assim que terminamos, começamos nova produção, visto que cada leva entre oito a 10 meses".
"Isto é algo que as pessoas normalmente não entendem, porque pensam que podemos ir ao supermercado e comprar 3,5 milhões de árvores, número que plantamos todos os anos", desabafa. "Não, nós capacitamos estas pessoas. Depois, principalmente as senhoras, cuidam e acompanham o crescimento das árvores".
"A responsabilidade principal está nas mãos dos locais", afirma Constantino Aucca Chustas, após referir que os técnicos do seu projeto só intervêm caso seja necessário controlar pragas e outras doenças.
O "Campeão da Terra" ainda revela que as comunidades não recebem salários pelo trabalho que efetuam no dia a dia. "No final da época de produção, vendem tudo à ECOAN. Depois, podem utilizar o dinheiro que recebem para melhorar a irrigação ou para outras necessidades da comunidade", refere. "Podem utilizar o valor no que quiserem, porém, têm de fazer um relatório. Devido à corrupção, não queremos que o dinheiro fique só com uma pessoa".
O viveiro de Patacancha encontra-se inserido no programa de reflorestação da área de Vilcanota gerida por Gregorio Ferro. No total, 25 comunidades contribuem e beneficiam deste programa que tem como objetivo plantar 700 mil mudas por ano.
"Cada comunidade tem o seu viveiro e a forma como cada uma gere e se organiza difere", conta Tino. "Nós respeitamos e nunca tentamos mudá-los".
Ao longo dos Andes e num período de 45 anos, Constantino Aucca Chustas espera plantar 100 milhões de árvores. "Porquê? Porque temos a crise climática, da água, sobrepopulação e, o pior, a maioria destas comunidades está abandonada", justifica.
Face ao futuro, Constatino é otimista, mas reticente. “Recebemos o prémio Earthshot Prize do Príncipe William. Há coisas boas a acontecer, porém, o único problema é a falta de dinheiro”, lamenta. “Para plantar 3,5 milhões de árvores num ano, preciso de 4,5 milhões de dólares”.
Assim, em conjunto com a TUI Care Foundation, a ECOAN vai procurando soluções para dar autonomia aos projetos e reflorestar. “Estamos a pensar em promover algumas atividades turísticas e o ecoturismo, mas também criar mais trilhos e desenvolver um programa de turismo místico”, adianta.
“Há muitas hipóteses, mas vamos fazendo sem pressa, conversando com as comunidades e respeitando-as”, reforça.
Por que plantar polylepis importa?
Também conhecidas como árvores “nuvens”, as polylepis, que crescem até 5 mil metros acima do nível do mar, desempenham um papel importante na luta contra as alterações climáticas e perda de biodiversidade.
De acordo com Tino, as florestas de polylepis têm como função reter humidade e água, o que mantém os solos ao seu redor saudáveis e os riachos das montanhas a fluir. "Antes, os nativos queriam eucaliptos, porque os resultados eram mais imediatos", explica-nos, acrescentando que, nos últimos cinco anos, mudaram de opinião e agora estão mais focados nas polylepis apesar de crescerem apenas um milímetro de diâmetro por ano.
As polylepis desempenham também um papel vital na garantia da segurança hídrica para milhões de pessoas nas montanhas andinas, mas também nas cidades e aldeias das terras baixas, onde a água do degelo dos glaciares é uma fonte essencial. Lar de abundante vida selvagem, incluindo condores andinos, ursos de óculos e pumas, são também um importante habitat natural de animais ameaçados de extinção.
TUI Forests lança campanha de adoção de árvores nativas
Quem quiser ajudar e não poder plantar árvores, pode adotar de forma simbólica uma árvore através do site desta organização solidária.
Os interessados podem adotar para si ou para oferecer, existindo para ambas as hipóteses uma versão premium.
O SAPO Viagens visitou o Peru a convite da TUI Care Foundation
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