Por: Sara Hussein / AFP

Sobreviveu à primeira bomba atómica lançada pelos Estados Unidos e conseguiu voltar para casa, mas o horror estava apenas a começar.

O pai, que trabalhava perto do centro da cidade, procurou o irmão mais velho de Ito, de 12 anos, num cenário apocalíptico. Quando encontrou-o, o rapaz estava tão gravemente queimado que os seus pais se recusaram a permitir que Masao o observasse. Morreu alguns dias depois em casa.

A irmã de Masao, de 10 anos, estava em casa de um parente próximo, que ficou totalmente destruída pela bomba.

"As pessoas que fugiram do hipocentro foram para a periferia, onde ficava a nossa casa. Tiveram queimaduras terríveis e mal conseguiam andar", descreve Masao, hoje com 82 anos, em entrevista à AFP.

Os seus pais convidaram os sobreviventes para descansarem em sua casa. "Mas morreram, um atrás do outro", relembra.

Face aos dias quentes de agosto, os corpos tinham de ser removidos, mas não havia cemitério para onde levá-los. "Foram transportados para um espaço aberto, não em caixões, mas uns por cima dos outros. Aí derramaram gasolina para queimá-los", relata Ito.

"Foi simplesmente horrível, um cheiro horrível. Uma cena que eu gostaria de poder esquecer", desabafa.

Ex-funcionário de um banco e agora reformado, Masao Ito trabalha há quase 20 anos como guia voluntário para o Museu do Memorial da Paz em Hiroxima e milita contra as armas nucleares.

Ele faz parte do número cada vez menor de "Hibakushas" da primeira geração, ou seja, os sobreviventes dos bombardeios atómicos que mataram 140.000 pessoas em Hiroxima, e 74.000, em Nagasaki.

Esta semana, os líderes das democracias do G7 reúnem-se em Hiroxima.

Masao Ito
Masao Ito trabalha há quase 20 anos como guia voluntário para o Museu do Memorial da Paz em Hiroxima créditos: Richard A. Brooks / AFP

É melhor não ter armas nucleares

Ito espera poder dizer-lhes que, "se tiverem armas nucleares, podem sentir-se tentados a usá-las, e acidentes podem acontecer". Por isso, "é melhor não tê-las".

Com um alfinete que representa um míssil retorcido coroado por um símbolo antinuclear, reconhece que um mundo sem armas atómicas parece utópico, enquanto Rússia e Coreia do Norte "fazem ameaças regularmente".

Ainda assim, Ito acredita que, de Hiroxima, o G7 pode enviar uma mensagem clara aos líderes mundiais: "enquanto houver armas nucleares, a sua cidade pode transformar-se em Hiroxima. Está disposto a aceitar isso?".

A infância de Masao Ito foi destruída pela bomba. O pai morreu pelos efeitos da radiação e a empresa da família faliu. Ele e a mãe fugiram de Hiroxima para escapar de credores. Contraiu tuberculose e passou mais de um ano internado num sanatório, onde recebeu um pacote americano com remédios e uma Bíblia.

Leu o livro, mas, ao deparar-se com uma passagem exortando os cristãos a "amarem os seus inimigos", sentiu raiva e atirou a Bíblia contra a parede.

"Por que eu deveria amar a América?", recorda-se de ter pensado na época. Mais tarde, Ito converteu-se ao cristianismo, mas a raiva não diminuiu.

Com o tempo, e especialmente depois de conhecer americanos chocados com o que aconteceu em Hiroxima, os seus sentimentos mudaram. Para Ito, os jovens estudantes que integram os grupos turísticos que guia têm um papel importante a desempenhar.

"Não posso continuar para sempre. Eu digo-lhes: 'agora cabe a vocês conseguir um mundo sem armas nucleares'", ressalta.

O mundo inteiro no seu email!

Subscreva a newsletter do SAPO Viagens.

Viaje sem sair do lugar.

Ative as notificações do SAPO Viagens.

Todas as viagens, sem falhar uma estação.

Siga o SAPO nas redes sociais. Use a #SAPOviagens nas suas publicações.