"Como toda a investigação arqueológica produzida" em 40 anos, os achados, conhecimentos e projetos desenvolvidos pelo CAM são "extremamente variados", mas há uma "predominância" dos ligados à civilização islâmica, disse o diretor da instituição, o arqueólogo Cláudio Torres, em entrevista à agência Lusa.
Segundo o arqueólogo, "não há dúvida que a principal constatação científica" do CAM está relacionada como a forma e o modo como se processou a islamização de Mértola e do sul da Península Ibérica.
Hoje sabe-se que a islamização não resultou de uma conquista militar, "como foi divulgado pelos vencedores e vencidos", mas sim de "um lento processo de conversão" ao Islão da comunidade cristã autóctone, "de culto donatista, que era hostil aos católicos e trinitários de Roma e aliada dos antitrinitários muçulmanos", explicou.
Desde o início da atividade do CAM, em 1978, o interesse científico dos investigadores "dirigiu-se e concentrou-se na civilização islâmica", disse à Lusa Cláudio Torres, referindo que "não é por acaso" que "o único museu islâmico" existente em Portugal está em Mértola, que, nos séculos XI e XII, foi capital de um reino islâmico e um importante porto comercial nas rotas do Mediterrâneo.
"É também um dos museus de arte islâmica mais importantes da Europa e, sobretudo, o único que sistematiza em todo o ocidente Mediterrânico a dinâmica de formação das primeiras manifestações da linguagem plástica da arte islâmica, nomeadamente na cerâmica", frisou.
O Museu Islâmico é um dos 14 núcleos do Museu de Mértola, 11 situados na vila e os restantes em outras três localidades do concelho e todos criados pelo CAM para preservar achados arqueológicos e edifícios emblemáticos.
Dos 11 núcleos na vila, Cláudio Torres destacou a igreja Matriz, que foi uma mesquita, e o castelo, classificados como monumentos nacionais, os núcleos romano e de arte sacra, a basílica paleocristã e a oficina de tecelagem.
Segundo o arqueólogo, apesar do peso da civilização islâmica, entre os achados dos investigadores do CAM, "sempre presentes" em qualquer intervenção no subsolo da vila, destacam-se "níveis romanos de grande importância" que motivaram a musealização de uma casa romana escavada sob o edifício da Câmara de Mértola e onde é visitável o núcleo romano.
Investigadores do CAM também encontraram e escavaram "exaustivamente" uma "importante" basílica e, no seu interior, uma "imensa" necrópole do período paleocristão, sobre a qual estavam centenas de sepulturas muçulmanas.
Este "importante monumento" dos séculos V ao VII foi coberto com um edifício, onde estão musealizadas ruínas da igreja e expostas 30 lápides funerárias paleocristãs.
Arqueólogos do CAM também descobriram, na alcáçova do castelo de Mértola, dois grandes batistérios paleocristãos, o que confirma a existência de duas comunidades cristãs diferentes naquela época na vila.
Mais recentemente, arqueólogos do CAM descobriram, durante a obra de reabilitação da Casa Cor de Rosa, no centro de Mértola, quatro grandes estátuas romanas, datadas do século I, uma das quais, com três metros de altura, é a imagem de um imperador romano.
No século XVI, nas imediações, tinham sido descobertas outras estátuas da época, que foram levadas para o Museu Nacional de Arqueologia, em Lisboa, disse, referindo que a descoberta das últimas quatro estátuas coloca ao CAM "o grande problema da sua musealização e, como é natural, algumas dúvidas de interpretação".
Devido ao abandono das igrejas rurais do concelho de Mértola e em resposta ao roubo de peças religiosas, o CAM inventariou e recolheu 40 artefactos de arte sacra que estavam "em perigo" e estão expostos no núcleo de arte sacra situado na igreja da Misericórdia.
Para "salvar" uma atividade artesanal "em perigo", destacou o arqueólogo, o CAM criou uma Oficina de Tecelagem, que é um núcleo do Museu de Mértola onde trabalham "as duas últimas tecedeiras" do concelho para continuarem "a tecer e a ensinar a sua arte".
Através da descoberta dos motivos geométricos tecidos nas mantas de lã da região, investigadores do CAM constataram ligações civilizacionais entre a Serra do Algarve e as zonas montanhosas norte-africanas de Cabília, na Argélia, e do Rife, em Marrocos.
Fonte: Lusa
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