Reportagem: Carlos Mandujano / AFP
Vistas de cima, as espirais formadas no meio do deserto do Peru pelos "olhos d'água" impressionam. Fazem parte de um sistema pré-colombiano de aquedutos subterrâneos, o qual, a partir dos Andes, segue a irrigar três vales da região dos famosos geoglifos de Nazca.
Construídos há aproximadamente 1.700 anos próximo à cidade de Nazca, 450km ao sul de Lima, os aquedutos estendem-se como galhos, formando um sistema de poços e canais feitos de pedras e vigas de huarango, uma árvore costeira peruana.
A obra é uma maravilha da engenharia hidráulica iniciada pelos habitantes da antiga cultura Nazca, e a sua preservação levou as autoridades peruanas a proporem que ela se tornasse património da humanidade à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
"Agora sabemos que foram construídos por volta do ano 100 a 200 d.C., em pleno desenvolvimento da sociedade Nazca", disse o diretor do Plano de Gestão Nazca-Palpa do Ministério da Cultura, Johny Isla.
Essa civilização desenvolveu-se na costa sul do Peru e é-lhe também atribuída as misteriosas e famosas linhas de Nazca, cuja elaboração é posterior à dos aquedutos. "Os dois são contemporâneos e foram feitos pela mesma sociedade", explica Isla.
"Único na América do Sul"
Dos 42 aquedutos de Nazca, 29 ainda transportam água dos picos cobertos de neve e rios para as terras agrícolas onde são cultivados batatas, algodão, vegetais e árvores frutíferas.
O sistema transporta cerca de 18 a 20 litros de água por segundo. Hoje, beneficia aproximadamente 900 famílias de pequenos agricultores dos três vales de Nazca, em especial para os seus cultivos. Pagam 120 sóis anuais (cerca de 30 euros) a uma entidade local.
"Isso ajuda-nos a irrigar todas as plantações", conta o agricultor Nicolás Quispe, de 39 anos, que mantém o cultivo de batatas com água do aqueduto de Ocongalla.
"É o único em toda a América do Sul", destaca Isla, enquanto percorre o aqueduto de Cantalloc com uma equipa da AFP, protegido pelo geoglifo de um felino que parece vigiar o curso das águas subterrâneas de uma colina vizinha.
As pedras dos canais são de seixo arredondado e são colocadas de forma a filtrar a água nos poços, cuja profundidade chega a 15 metros.
"Sem esse sistema, não teria sido possível existir uma civilização como a cultura Nazca", assegurou o arqueólogo Abdul Yalli, depois de enfatizar que os rios da região secam durante quase o ano todo.
"Olhos d'água"
Os poços são considerados uma grande obra pública milenar.
"Essa é uma obra de arte, de arquitetura e de engenharia. São canais de pedra que seguem a funcionar e, evidentemente que, para poder construí-los, removeram-se milhões de toneladas de areia, para fazer o canal e tapar de novo", destacou o espanhol Jorge López-Doriga, diretor de Comunicação do Grupo AJE, a multinacional peruana que apoia as autoridades locais na valorização desta obra hidráulica.
Os aquedutos de Nazca estão na lista indicativa da Unesco para serem declarados Património Cultural da Humanidade, após a inscrição em 2019.
"Não existe noutro lugar do mundo esse tipo de aqueduto, que é como uma espiral", indicou Ana María Cogorno, presidente da Associação Internacional María Riche, que trabalha divulgando o valor das linhas de Nazca.
Património da Humanidade desde 1994, as linhas de Nazca são, segundo a Unesco, "o grupo de geoglifos de maior destaque do mundo e são incomparáveis em extensão, magnitude, quantidade, tamanho e diversidade em relação a qualquer outro trabalho similar".
Trata-se de uma série de figuras geométricas e de animas gigantes realizadas no deserto que apenas podem ser apreciadas do céu. O significado ainda é um enigma: alguns inesvtigadores consideram-nas um observatório astronómico, e outros, um calendário.
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