Bilhete-postal por Pedro Neves
Não é possível passar pela entrada do Jardim Botânico de Lisboa sem reparar nela: uma roseira carregada de flores “entre o rosa pálido e o salmão”. Por estes dias, pode dizer-se que é uma das mais encantadoras atrações do espaço verde, classificado como monumento nacional.
Um olhar mais demorado revela do que se trata — é "só" uma das criações portuguesas mais apreciadas no meio botânico. Uma pequena placa no local informa estarmos perante uma roseira chamada “Bela Portuguesa”, desenvolvida no início do século XX por Henri Cayeux, o jardineiro chefe do Jardim Botânico entre 1892 e 1909.
Os menos habituados, como eu, a lidarem com estas formosuras podem ser levados a atribuir apenas à Natureza aquilo que, na realidade, se deve à criatividade de um botânico paciente. "Não é uma espécie de rosa, mas sim um híbrido da espécie Rosa gigantea Collett ex Crép", esclarece-me, por e-mail, César Garcia, coordenador dos jardins botânicos do Museu Nacional de História Natural e da Ciência.
À espécie natural, Cayeux combinou outra variedade de roseira para chegar à Bela Portuguesa, que adjetivou como "magnífica" no artigo científico que escreveu em 1929 sobre as suas invenções botânicas. É por isso que podemos falar numa criação, mais uma a juntar-se às milhares de variedades híbridas que foram sendo aperfeiçoadas ao longo dos séculos pelo sentido de beleza humano.
Além de ser uma trepadeira muito vigorosa e resistente, que pode atingir os 5 metros de altura, é descrita como uma das primeiras roseiras a florir no início da primavera. E posso confirmá-lo: na semana passada, as suas grandes flores (que podem atingir os 15 centímetros de diâmetro), a par de alguns botões em carmesim, já atraíam visitantes e outros curiosos alados.
Segundo Miguel Albuquerque (sim, o Presidente do Governo Regional da Madeira, e um amante de rosas) no seu blog, a Bela Portuguesa "é hoje uma roseira muito popular em quase todo o mundo, sobretudo no sul da Europa, na Califórnia, na Austrália, na Nova Zelândia e na Índia".
A sua presença à entrada da Politécnica é mais recente, tendo sido plantada ali na comemoração dos 135 anos do Jardim Botânico de Lisboa (em 2013) por iniciativa dos seus funcionários.
As chuvas dos últimos dias parecem ter enfatizado a característica exuberância da roseira. No passado domingo, as suas hastes mostravam-se ainda mais crescidas, mesmo que curvadas sob o peso das suas grandes flores. A única nota de deceção a assinalar? A ausência de qualquer fragrância. Esta beldade portuguesa dispensa perfume.
Ao nível do olfato, todavia, fica um desafio: apenas pelo odor que exala, tentem identificar a canforeira existente num dos recantos do Jardim Botânico. Entrar na sombra desta árvore nativa do Extremo Oriente é como ser assaltado por uma nuvem de aromas adocicados. A par da Bela Portuguesa, é um dos muitos motivos de curiosidade que justificam uma visita primaveril a este pulmão da capital — especialmente aos domingos de manhã, quando a entrada é gratuita (das 10h às 13h).
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