Esta expressão regional (que significa bora lá, ou vamos lá), bem conhecida nos municípios à volta de Carrazeda de Ansiães, nem sempre foi bem acolhida pelos carrazedenses, que lhe atribuíam uma conotação negativa, por ser terra de excelente de vinho, propícia a excessos. “Consumida com moderação”, todavia, bem podia servir de slogan promocional a um território que garante experiências fantásticas e memoráveis.

A beleza das paisagens, os cenários bucólicos, a surpreendente arquitetura da natureza, são por norma cartaz para chamar a atenção e atrair os visitantes. E Carrazeda tem dezenas de locais dignos de um postal, associados à paisagem, às atividades económicas e também ao património. Foi com o impulso de positividade que a expressão “Bota Pra Carrazeda” nos proporcionou, que fomos explorar, a convite do município, alguns desses locais.

A Caminhar até ao Douro

A inauguração de duas das cinco novas Pequenas Rotas (PR), que aumentam a rede de Percursos Pedestres do concelho para oito trilhos, foi o motivo para esta visita ao concelho. O desafio era fazer dois trilhos que se cruzem e complementem, de uma só vez, percorrendo mais de 18 km. Uma caminhada surpreendente que leva o pedestrianista ao encontro de lugares excecionais e que permitem perceber como a paisagem se transforma, e aqui se prova a diversidade paisagística deste concelho.

Caminhar com vista para o Douro
Caminhar com vista para o Douro Há cinco novas Rotas Pequenas que permitem caminhar com vista para as paisagens do Douro.

A Fraga da Ola, que dá nome ao primeiro trilho, tem um imponente miradouro com uma vista privilegiada sobre o Douro, que nos permite perceber, nas próprias encostas do Douro, a transição de uma paisagem rochosa, agreste, com uma forte presença de sobreiros, que de repente dá lugar à paisagem típica do alto douro vinhateiro: os ciprestes a marcar a entrada nas quintas, que nas encostas cheias de socalcos, produzem o excelente vinho do Douro e também o vinho do Porto. Estamos em Plena Região Demarcada do Douro, classificado pela UNESCO como Património Mundial da Humanidade.

Como estes trilhos são circulares, regressamos à paisagem anterior. Ao longo da caminhada encontramos diversas estruturas que caracterizam a paisagem rural, muros, zonas de pasto, apiários, fornos de secar os figos, até chegar à “aldeia dos Moinhos” que integra o Museu Rural.

Vale do Tua

Não há monotonia na paisagem em Carrazeda. A zona central do concelho é planáltica, mas a norte e a Sul o cenário muda radicalmente.

Miradouro Olhos do Tua
Miradouro Olhos do Tua Miradouro Olhos do Tua créditos: Ana Fragoso

A Norte, o rio Tua exibe uma zona com uma orografia difícil, mas que desenha quadros fantásticos. Existe uma rede de Miradouros impressionantes, já com estruturas de apoio ao visitante, que garantem uma observação segura e plena.

Em Foz Tua, há dois espaços de interpretação que nos permitem compreender a região e nos orientam para os locais de maior interesse: O Centro Interpretativo do Vale do Tua (CIVT) e a Porta de Entrada no Parque Natural Regional do Vale do Tua (PNRVT). Ali percebe-se a história, descobrem-se as particularidades do território, as curiosidades, os costumes e tradições e recebe-se toda a informação necessária para uma experiência do território plena.

Centro Interpretativo do Vale do Tua
Centro Interpretativo do Vale do Tua O interior do Centro Interpretativo do Vale do Tua. créditos: Luís Ferreira Alves

O CIVT tem uma exposição permanente que está dividia em três grandes temas: o vale, a linha do Tua e a barragem.

O “Vale”, que pretende levar o visitante a envolver-se com o vale do Tua em toda a sua dimensão, natural e humana. Numa área tunelar (foi criado um túnel em cortiça) é recriada uma cápsula temporal que direciona o visitante num percurso de milhares de anos, desde a dimensão geológica e natural do vale até ao seu povoamento.

A “Linha do Tua” tem como objetivo recordar e aproximar. A ideia é levar o visitante a recordar o caminho-de-ferro e compreender a realidade local, podendo envolver-se com o sentimento dos habitantes pela perda do acesso ao comboio.

No tema “Barragem” quer-se levar o visitante a compreender este aproveitamento hidroelétrico como algo incontornável ao Tua. Independentemente do posicionamento de cada um, demonstra-se a relação estabelecida pelo desenho do arquiteto Eduardo Souto de Moura, entre a paisagem e a exigência da tecnologia. A cenografia tenta demonstrar a coexistência da diversidade de opiniões, de paisagens e desenhos que culminaram no processo hídrico do Tua. Qual o papel fundamental da barragem do ponto de vista socioeconómico, do aproveitamento hidroelétrico na região e país, as preocupações culturais, patrimoniais e ambientais na conceção e construção.

O Castelo de Ansiães

Do Castelo de Ansiães a vista panorâmica é brutal: avista-se todo o planalto de Ansiães, fortíssimo na produção de maçã, até ao rio Douro e ao Castelo de Numão, já no concelho e distrito vizinho.

O lugar está repleto de contos e lendas. Dizem que existia um túnel subterrâneo que ligava Ansiães ao Castelo de Numão, escavado por baixo do próprio rio Douro. O túnel nunca foi descoberto, mas a lenda revela exaltação da valentia dos povos originários deste local.

A origem desta fortificação defensiva remonta ao IIIº milénio a.C., assumindo particular importância durante o processo de Reconquista Cristã, que lhe terá valido a atribuição da sua primeira carta Foral, pelo rei leonês Fernando Magno. O foral mais antigo do território que hoje conhecemos como Portugal, que data do sec. XI. Apesar das difíceis condições de vida que a zona envolvente ao castelo tinha, das adversidades climáticas, ausência de água, entre outras, o local foi habitado durante séculos, até que em 1734, aos poucos habitantes que ali ainda residiam foi-lhes ordenado que abandonassem o local, mudando-se para as aldeias que, desde a idade média, cresciam nas redondezas de Ansiães.

Do ponto de vista arqueológico, o local é de enorme interesse. Podem ser vistas necrópoles, lagares escavados na pedra, ruínas do aldeamento, que mostram dois tipos de habitações, as mais amplas, possivelmente pertencentes aos homens mais ricos e outras de menor dimensão, de famílias mais humildes. O que atualmente se destaca no castelo é a Igreja de São Salvador de Ansiães. Um templo românico, cuja porta principal exibe um “Pentacrator”, cuja iconografia de “cristo em majestade” constitui o mais completo exemplar do românico português.

Museu da Memória Rural

Não se trata de uma única estrutura, mas de diversos Núcleos Museológicos espalhados por diversas freguesias. O edifício sede situa-se em Vilarinho da Castanheira e trata de diferentes ofícios tradicionais como o do ferrador, canastreiro, pescador do rio Douro, entre outros. No futuro, estarão também representadas técnicas antigas relacionadas com a economia local como os fornos de secagem de figos, construção de carros de bois ou os antigos fornos de produção de telha. Cada objeto tem a respetiva descrição, mas o que Alexandra Lopes, arqueóloga da autarquia, é sinonimo de diferenciação e de valorização, “é a recolha da memória oral”, os testemunhos vivos, de mulheres e homens, protagonistas da história que ali é contada, com recursos a diferentes ferramentas multimédia. Ainda na mesma freguesia, os moinhos de rodízio recuperados, do Ribeiro do Coito, inseridos num espaço de lazer bucólico e campestre, localmente conhecido como “a aldeia dos moinhos”.

Moinho de vento em Carrazeda de Ansiães
Moinho de vento em Carrazeda de Ansiães Existem apenas sete moinhos de vento em Trás-os-Montes, cinco deles na região de Carrazeda de Ansiães.

Os moinhos de água são comuns em toda a região, a raridade por aqui são mesmo os moinhos de vento. A arqueóloga da autarquia explicou-nos que apenas existem sete moinhos de vento em Trás-os-Montes, cinco deles na região de Carrazeda de Ansiães. O exemplar mais emblemático situa-se às portas da vila e foi restaurado em 2010. Uma estrutura do sec. XX, que terá trabalhado poucos anos, alegadamente, devido a uma construção inadequada, que resultou de uma cópia dos moinhos de vento do Sul do país, utilizando materiais e dimensões mais características de Trás-os-Montes, que dificultaram a operacionalidade do moinho.

Na aldeia da Lavandeira, o Núcleo Museológico do Azeite do Museu da Memória Rural mostra ao visitante como era produzido o azeite num lagar tradicional de prensa de parafuso central. Todo o processo relacionado com a produção tradicional do azeite encontra-se aqui retratado ao nível do discurso museológico que se inicia na apanha da azeitona, nas “pulhas” trocadas entre ranchos de jornaleiros, no seu transporte, na sua limpeza antes da entrada no lagar, e no processo de moagem, de enseiramento, caldeamento, prensagem e finalmente na operação de decantação que irá levar à obtenção do fino fio de azeite. Todo o discurso museológico é sustentado em painéis gráficos e documentos de vídeo que recorrem a imagens de recolha etnográfica e documentação fotográfica antiga.

Moinho de Água de Carrazeda de Ansiães
Moinho de Água de Carrazeda de Ansiães Um exemplo de um moinho de água, em Carrazeda de Ansiães

Localizado na aldeia de Luzelos, o Núcleo Museológico da Telha do Museu da Memória Rural mostra ao visitante como era produzido a telha tradicional: a recolha do barro, amassar, fazer a eira, moldar a telha, cozer a telha no forno e finalmente a distribuição e venda. Todo o discurso museológico é sustentado em painéis gráficos e documentos de vídeo que recorrem a imagens de recolha etnográfica e documentação fotográfica antiga.

Neste momento está em fase de implementação o Núcleo Museológico do Ferreiro e Ferrador, em Seixo de Ansiães. Além de albergar um vasto espólio, legado por um antigo ferrador e recriar uma oficina de ferreiro, vai abordar aspetos relacionados com elementos patrimoniais, como são os cinco núcleos de insculturas rupestres, popularmente conhecidas como “fragas das ferraduras”.

Onde Dormir

Hotel Grapple, em Carrazeda de Ansiães
Hotel Grapple, em Carrazeda de Ansiães A piscina do novo hotel de 4 estrelas em Carrazeda de Ansiães.

Nesta experiência ficamos alojados no Grapple – Hotel & Spa, um hotel de 4 estrelas, que abriu recentemente ao público. Um projeto que representa um sonho de uma família, construído por “amor à terra”, que representa um investimento próximo dos três milhões de euros. Um projeto da arquiteta Daniela Rebelo, com um estilo contemporâneo e sofisticado, com decoração da autoria da reconhecida decoradora nacional, Nini Andrade Silva.

O hotel tem 9 quartos duplos/twins com banho privativo e terraço ou varanda exterior; 1 suite com varanda e vista lago; 2 villas T2 com terraço e jardim privado – capacidade até 4+2 pessoas; 1 villa T1 – com terraço e jardim privado - capacidade até 2+2 PESSOAS; restaurante aberto ao público em geral com capacidade para 50 pessoas; uma sala para eventos com 300 M2 com capacidade para 200 pessoas sentadas; Bar com terraço exterior; SPA - piscina interior, jacuzzi, sauna e banho turco; piscina exterior (água salgada); piscina infantil (água salgada). Conta ainda com uma ampla área de espaços verdes e lago artificial com 640M2 e um Parque infantil.

Onde Comer

Nesta visita a Carrazeda de Ansiães tivemos a oportunidade de experimentar a excelência da gastronomia local no restaurante Convívio, restaurante Beira Rio, em Foz Tua, e na Taberna da Helena. Mas há mais restaurantes que oferecem paladares autênticos e o sabor inconfundível da “comida caseira”.

Por aqui é possível experimentar diversos pratos de carne, o mais tradicional é o cabrito e o cordeiro, mas também a vitela, quase sempre grelhada. Nos pratos de peixe o destaque vai para o peixe do rio, mais comum nos restaurantes de Foz Tua, e também o bacalhau assado e o polvo.

Os enchidos e o fumeiro, juntamente com os queijos, fazem parte das entradas, assim como o fantástico folar. Tudo isto sempre acompanhado pelo excelente vinho de Carrazeda de Ansiães, que merece sempre um brinde: “Bota Pra Carrazeda!”.

Casa dos Cantoneiros "Foz Tua Wine House"

Casa dos Cantoneiros
Casa dos Cantoneiros um espaço dedicado à divulgação e comercialização de vinhos e produtos regionais produzidos no concelho de Carrazeda de Ansiães.

A antiga Casa dos Cantoneiros, foi transformada numa “Wine House”, onde os visitantes têm a oportunidade de provas e adquiri vinhos, queijos, enchidos, compotas e frutos secos, ao preço do produtor. Este espaço está equipado com uma sala de exposição e venda de produtos regionais, uma sala de prova de vinhos, um pequeno auditório e uma esplanada com vista para os rios Tua e Douro. Localizada numa das principais portas de entrada do concelho, a Casa dos Cantoneiros “Foz Tua Wine House” funciona também como um posto de turismo avançado no território, onde é prestada toda a informação sobre os locais a visitar e o horário de funcionamento das infraestruturas turísticas e culturais do concelho de Carrazeda de Ansiães.

Sugestão

Se quiser fazer uma visita ao concelho de Carrazeda de Ansiães não deixe de contactar a Loja Interativa de Turismo (Telf:278 098 507), onde pode também solicitar uma visita guiada gratuita ao património do concelho.