Viajar no tempo ainda não é possível, mas visitar Toledo dá-nos a sensação de que entrámos num portal até à Idade Média.
Situada no topo de uma colina, com uma vista privilegiada para o “nosso” rio Tejo, a antiga capital de Espanha é constituída por cerca de 85.500 habitantes distribuídos por cerca de 230 quilómetros quadrados. Durante séculos, foi a casa de cristãos, judeus e muçulmanos que deixaram pelas ruas estreitas da cidade fortificada vestígios da sua presença, materializada em sinagogas, igrejas e mesquitas.
Pintada de tons terrosos e uma diversidade de motivos arquitetónicos – do gótico ao mourisco, do bizantino ao românico –, a cidade revela uma fusão única que culmina, após a Reconquista, no estilo mudéjar: uma reinterpretação islâmica da estética ocidental.
Toledo tem a sua herança cultural tão bem conservada que a cidade parece ter parado no tempo, alheia às demandas da modernidade. Caminhar pelo seu centro histórico faz-nos sentir protagonistas de um filme da época medieval, onde as ruas estreitas, as portas fortificadas e as muralhas imponentes nos transportam para o tempo dos reis e dos cavaleiros.
A espadaria toledana - um ofício milenar
Conservar a história e cultura é também manter vivas as tradições e ofícios que parecem quase extintas noutros lugares, nomeadamente a espadaria, com a qual se cruzará nas dezenas de montras espalhadas pela cidade.
A espadaria toledana é um ofício milenar que remonta até à época romana e que sobrevive até aos dias de hoje. Durante vários séculos, sobretudo durante a Idade Média e o Renascimento, as espadas produzidas pelos artesãos da região eram as mais famosas da Europa e arredores, cobiçadas pelos exércitos e realezas, não só pela sua beleza, mas principalmente pela sua eficácia e durabilidade. Atualmente, a cidade ainda abriga artesãos e pequenas empresas que produzem espadas e outros objetos de corte com o mesmo rigor e beleza de antigamente. Basta um pequeno passeio pelo centro histórico para perceber que a espada continua um símbolo vivo de uma cidade que se orgulha da sua herança e tradição.
Já pensou em dormir num museu?
Localizado no coração do centro histórico da cidade, a uma dúzia de passos de distância da Catedral de Toledo, encontra-se o Hotel Áurea Toledo, do Grupo Hotusa. É realmente um museu? Não, mas é um grande exemplo de como a modernidade pode conviver com o passado sem corromper a sua essência.
O hotel é fruto de uma cuidadosa restauração de sete casas antigas, de modo a preservar a autenticidade da arquitetura e dos elementos históricos dos séculos XIII e XIV, incluindo vestígios das épocas cristã e muçulmana que marcaram a história da cidade. Este compromisso com a preservação histórica cria uma atmosfera única e faz do Áurea Toledo um oásis de luxo, onde cada canto do hotel ecoa o rico passado cultural e arquitetónico da região. Os sete edifícios restaurados estão conectados por pátios comuns e somam um total de 66 quartos de 14 tipologias diferentes que vão desde os quartos mais compactos às suites mais espaçosas.
Adicionalmente, o hotel dispõe de comodidades de alto padrão, incluindo restaurante (onde é servido apenas o pequeno-almoço), um spa com abóbadas dos séculos XV e XVI, um ginásio, áreas de lazer e espaços para eventos.
Mas o que faz deste hotel em particular um verdadeiro museu?
O Áurea Toledo é uma autêntica fusão entre o antigo e o moderno. A restauração do edifício valorizou os detalhes arquitetónicos originais pelo que por entre os tesouros históricos que poderá encontrar no espaço constam arcos mouriscos, painéis policromados do século XV, cisternas, tetos esculpidos e vigas islâmicas do século XI.
Em vários quartos disponíveis, para além de uma vista privilegiada para alguns dos monumentos mais conhecidos da cidade, encontrará pinturas e frescos de iconografia cristã parcialmente recuperados, e arabescos geométricos e vigas de madeira de influência mourisca.
Além dos vestígios físicos, o Hotel Áurea Toledo enriquece a experiência cultural de seus hóspedes através de atividades que contextualizam a herança histórica do local, nomeadamente visitas guiadas por especialistas em história e arte local, e exposições. Um grande exemplo são as peças expostas no lobby do hotel, que pertencem ao jovem artista, Mario Argumánez. Tratam-se de peças de cerâmica que representam, com um olhar contemporâneo, os diferentes períodos da história da capital.
Assim, o Áurea Toledo não é apenas um local para dormir, mas uma imersão na história viva da região, onde cada peça e detalhe arquitetónico são testemunhos das eras que passaram e do legado deixado pela cidade. Toledo é a “cidade das três culturas” e este hotel é um reflexo fiel da multiculturalidade que nos convida a voltar atrás no tempo.
Obrador de Santo Tomé – a mesma receita há 168 anos
E, por falar em voltar atrás no tempo, recuemos até 1856 e falemos agora numa outra tradição secular que faz as delícias dos turistas que visitam a cidade – o “mazapán” ou, em bom português, massapão.
Não é apenas pelo seu património histórico ou pela espadaria que Toledo recebe milhões de visitantes anualmente. A cidade tornou-se um dos centros mais renomados da produção de bolinhos de massapão, que é particularmente popular durante as festividades de Natal, embora seja apreciada durante todo o ano.
Trata-se de um doce feito com amêndoa, açúcar e mel, uma herança gastronómica que mistura influências árabes e cristãs, e nos transporta para a época medieval.
Em Toledo, os doces mais requisitados são os que se produzem na Confeitaria Santo Tomé, localizado no centro histórico da cidade. É uma empresa familiar com 168 anos, cuja receita se mantém a mesma desde o primeiro dia. “Nesta casa usamos apenas a maquinaria indispensável para conseguirmos fazer o nosso trabalho com a máxima qualidade. Todo o resto é feito manualmente com muito carinho”, garante Baker Abderrahman, diretor de qualidade da Confeitaria, ao SAPO Viagens.
Neste espaço, para além desta iguaria certificada pela IGP e de toda uma variedade de outros doces tradicionais, encontrará ainda a maior escultura de massapão do mundo, com o selo da Guinness World Records, com uma altura de 3,59 metros. Trata-se de uma representação do Dom Quixote de 600 quilos produzida pela equipa de mestres confeiteiros de Santo Tomé.
Quando o sol se põe e as luzes se ligam
Não há maneira melhor para conhecer um sítio do que explorá-lo a pé e, para conhecer alguns tesouros do centro histórico de Toledo, a única opção pode ser mesmo uma caminhada, uma vez que o trânsito é condicionado em vários lugares da cidade.
Dois dias são o suficiente para ficar a conhecer bem a cidade, pelo que pode ser um destino perfeito para uma escapadinha de outono. Se não sabe por onde começar, aqui fica uma pequena lista de lugares repletos de riqueza histórica que valem muito a pena conhecer:
- Catedral de Toledo: É a segunda maior catedral de Espanha que mistura os estilos gótico, romântico, renascentista, barroco, mourisco e mudéjar. No seu interior está sepultado o rei português, D. Sancho II, e o edifício abriga ainda obras de renomados artistas como Goya, Caravaggio e el Greco.
- Sinagoga Santa Maria la Blanca: Trata-se do grande símbolo da comunidade judaica em Toledo. A sua construção data o século XII e, a meados do século XIX foi declarado monumento nacional. No século XX, após a Guerra Civil Espanhola, o edifício foi entregue à Igreja Católica.
- Alcázar de Toledo: Um palácio fortificado, localizado na zona mais alta da cidade. A sua edificação começou durante a ocupação do Império Romano, no século III. Ao longo da sua história, foi restaurado várias vezes e ocupado pela realeza. Depois da capital ser estabelecida em Madrid, o palácio serviu de prisão da coroa, Academia de Infantaria e atualmente alberga o Museu do Exército e da Biblioteca de Castilla-La Mancha.
- Mesquita do Cristo de la Luz: A sua construção transporta-nos para a altura dos califados e data o século I d.C. É um dos edifícios mais bem conservados da cidade e constituí uma importante amostra da herança muçulmana.
- Mosteiro de São João dos Reis: A par da Catedral de Toledo, esta é uma das mais importantes amostras da arquitetura de estilo gótico isabelino. Trata-se de uma encomenda feita pela rainha Isabel I de Castela ao arquiteto Juan Guas, em agradecimento pela vitória na Batalha de Toro.
A par das paisagens deslumbrantes que encontrará pela cidade durante o dia, dê-lhe uma oportunidade quando o sol se põe e considere um passeio por um dos miradouros de Toledo. A vista noturna a partir do Miradouro del Valle é de cortar a respiração. Neste ponto terá uma visão panorâmica, onde vários monumentos ganham uma nova beleza com a ajuda das luzes da cidade.
Embora Toledo seja uma cidade viva e habitada, parece imersa numa nostalgia onde a pressa contemporânea e os edifícios megalómanos, que parecem tocar o céu, não têm espaço. A maioria das edificações preserva a sua fachada original recusando as influências modernas que tendem a dominar as cidades e fazer delas reféns. Ao invés de se adaptar às tendências do presente, Toledo escolheu preservar em cada esquina uma lembrança do passado, onde a quietude contrasta com a velocidade frenética do mundo atual.
O SAPO Viagens visitou Toledo a convite do Grupo Hotusa
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