Identificada com uma etiqueta plástica que diz "2TK" numa pata e uma anilha metálica com nove dígitos na outra, esta rola-do-mar (Arenaria interpres) passou meses a alimentar-se de restos de mexilhões, perto de ostraceiros e de outras aves, num grupo de rochas às margens do oceano.

Agora, a ave está prestes a regressa à sua terra natal, o Canadá, para se reproduzir, conta Álvaro Pérez Tort (48), fotógrafo do grupo de observadores Birdwatching Punta del Este, que avistou o animal pela última vez em abril.

"O 2TK conquistou o meu coração" desde o primeiro avistamento em 2016, afirma à AFP. Após perceber que a ave estava identificada, fez dezenas de fotos com o seu zoom potente para decifrar o número minúsculo presente na anilha.

Desde então, Pérez propôs-se a registar o "máximo possível" da ave. E voltou para vê-la todos os anos, oito vezes no total.

A proeza

2TK é uma rola-do-mar macho de aproximadamente 14 anos, segundo o Laboratório de Anilhamento de Aves, um órgão vinculado ao Serviço Geológico dos Estados Unidos (USGS, na sigla em inglês) que controla a marcação de um milhão de aves anuais na América do Norte, com objetivos de investigar e conservar.

A 2TK foi marcada em 2012 na baía de Delaware, na costa dos EUA, uma importante paragem para muitas espécies migratórias do chamado corredor atlântico.

Quando os alimentos ficam escassos no inverno canadiano, a ave vem para o sul. E quando termina o verão, segue para o norte.

2TK, a ave do Ártico que se apaixonou por Punta del Este
2TK, a ave do Ártico que se apaixonou por Punta del Este

Todas as vezes que Pérez Tort volta a encontrá-la, informa o site www.reportband.gov, a base de dados com registos de avistamentos em todo o continente.

Para Antonio Celis-Murillo, chefe do Laboratório de Anilhamento de Aves, informar os avistamentos é crucial para "montar o quebra-cabeça" dos movimentos de cada ave.

Os dados permitem traçar os padrões de comportamento de cada espécie: o trajeto, as paragens, o tempo que permanecem nelas, etc., e assim refinar as estratégias de conservação.

Segundo um estudo de 2019, publicado pela revista Science, desde 1970, três biliões de aves silvestres desapareceram da América do Norte.

Alta fidelidade

Segundo os cientistas, as aves migratórias de longas distâncias escolhem os locais favoritos de invernada, e mostram-se fiéis ao lugar, visitando-o ano após ano.

A 2TK, por exemplo, já percorreu ao longo da sua vida cerca de 350.000 quilómetros, o equivalente a dar nove voltas na Terra, uma proeza incrível para um animal com pouco mais de 20 centímetros.

Os sofisticados mecanismos fisiológicos e neurológicos que estas aves utilizam para navegar com precisão e encontrar uma superfície muito pequena e específica, após percorrer milhares de quilómetros em semanas, continua a ser objeto de estudo.

Contudo, para os observadores de aves do Uruguai, a razão para o regresso fiel de 2TK seria algo mais parecido com o amor.

"Existem muitas pessoas aqui, da região e do resto do país, que a registam há muito tempo, e todos compartilhamos a mesma paixão e a mesma alegria", sorri o fotógrafo Pérez.