Nascido no Tibete e com 2.900 quilómetros de extensão, o Brahmaputra percorre o Himalaia até o golfo de Bengala, e é fonte para a sobrevivência de milhões de pessoas.
Devido às mudanças climáticas, os dilúvios da temporada de monções têm sido gradualmente mais intensos. A má administração pública piora o problema e o futuro parece assustador para os 170 mil habitantes de Majuli: cada vez mais as enchentes inundam a ilha fluvial durante um período maior, o que prejudica as plantações e torna a terra infértil.
À medida que as chuvas começam, os habitantes locais - na sua maioria nativos das aldeias Mishing, seguidores de uma religião proveniente do hinduísmo - migram com os respetivos animais para as terras mais altas. Porém, em breve não terão mais novos espaços para se instalar.
"Amamos o rio, mas sabemos que um dia vai engolir a nossa terra. Só nos resta rezar para que o Brahmaputra desacelere o seu ritmo (de aumento no nível da água) e possamos viver em harmonia como as gerações anteriores", disse Sunil Mili, um produtor de mostarda e arroz.
No cenário atual, a Índia enfrenta uma crise de água completa, já que o aquecimento global gera fenómenos climáticos extremos e o planeamento ambiental simples do país põe milhões de vidas em risco.
A crise múltipla enfrentada pela Índia, - que passa por secas severas, fortes inundações e o constante aumento dos níveis fluviais e marinhos -, faz com que o abastecimento de água seja suspenso com regularidade.
"À medida que a população do país aumenta, é previsto que a crise da água piore, atingindo cerca de 1,6 bilhão de pessoas em 2050", ressalta Pradeep Purandare, um ex-professor do Instituto de Gestão da Água e da Terra.
Devastado
Majuli, famosa devido aos mosteiros do século XVI, tinha uma área de 1.250 quilómetros quadrados em 1890, mas o rápido aumento no volume do Brahmaputra já afundou uma grande parte da ilha.
Atualmente, só restam apenas 515 quilómetros quadrados, e a ilha pode desaparecer por completo entre os próximos 15 e 20 anos, segundo o Conselho de Proteção e Desenvolvimento da Ilha Majuli, uma ONG local.
Trata-se de uma realidade bastante conhecida por Nandiram Payeng: todo o seu povoado foi engolido pelo Brahmaputra.
"Tínhamos as nossas casas, lugares e a nossa economia. Estávamos satisfeitos e felizes. Porém, em 2017, o rio veio e levou tudo", lembra Payeng.
"Agora cultivamos em terrenos de outras pessoas e temos que pagar com metade do nosso lucro", conta o homem, de 55 anos.
Embora os moradores da ilha tenham começado a abandonar o território ainda em meados do século XX, nos últimos tempos a sua migração tornou-se um verdadeiro êxodo. Segundo fontes oficiais locais, cerca de 10 mil famílias deslocaram-se nos últimos 12 anos.
Chamado pelo nome do filho do deus hindu Brahma, o rio é considerado sagrado e é conhecido por ser um local de oferendas.
"A cada ano que passa o Brahmaputra torna-se maior. Está a perder o seu fluxo e está a ficar mais largo. Está a invadir as margens e a provocar erosão na nossa terra de forma contínua", ressalta Mitu Khatamiar, um jornalista local.
De acordo com cientistas, a principal causa para as fortes inundações é o degelo das geleiras do Himalaia, que pode perder até dois terços do material por descongelamento até 2100.
O Brahmaputra e muitos outros grandes rios da Índia dependem inteiramente da neve e do gelo das montanhas. Um aumento do degelo significa mais água a curto prazo, mas os efeitos dessa quantidade descongelada é incontrolável.
Catástrofe
A mudança climática fez com que as monções sejam cada vez mais imprevisíveis: começam depois do período esperado e os dilúvios acabam por ser mais avassaladores, mesmo que a quantidade total de chuva tenha diminuído.
"Há dilúvios repentinos intensos com os quais a região não está acostumada, o que causa uma catástrofe", explica Suruchi Bhadwal, professor emérito do departamento de Ciências da Terra e Mudanças Climáticas do Instituto de Energia e Recursos.
"Estes incidentes podem aumentar nos próximos anos", alerta, explicando que o degelo das geleiras gera o aumento no volume dos rios e um excedente de água.
No entanto, há poucas formas de aproveitar e de armazenar a água quando há abundância, e falta uma boa gestão quando a situação é inversa e as populações ainda enfrentam o corte no abastecimento hídrico.
"Falta, a nível nacional, a gestão de água, a administração e a regulação. Quando há água disponível, deveria saber ser utilizada", acrescenta Purandare.
Recentemente, o primeiro-ministro indiano Narendra Modi criou o ministério de Jal Shakti, que tem como objetivo pensar na melhor forma de gerir os recursos hídricos e administrar todo o ciclo, como o acesso a água potável e saber lidar com as inundações.
O crescimento demográfico ao longo das margens do rio também piora o problema: à medida que mais pessoas vivem nas proximidades do Brahmaputra mais áreas protegidas são destruídas para a construção de mais casas e aldeias.
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