Meia tonelada de madeira de pinho vai ser transformada até ao final do mês, em Melres, concelho de Gondomar, por um mestre reformado e duas dezenas de formandos num barco valboeiro de seis metros, utilizando apenas ferramentas de carpinteiro.
Inserido no projeto da oficina fluvial criada em Gondomar para devolver ao rio Douro um dos seus barcos a remos mais icónicos, a construção está a cargo do mestre Manuel Sousa, que, aos 67 anos, investe tempo da sua reforma na construção do barco.
Pelo meio ensinará a sua arte a formandos oriundos de Gondomar, Matosinhos, Vila do Conde e de Inglaterra.
Artur Sousa, promotor do projeto, contou à Lusa que o barco em construção junto à praia de Melres respeita a tradição centenária.
“Isto é a realidade. A madeira foi cortada na segunda-feira de uma árvore do monte, os materiais são um serrote, umas enchós, martelos, fios de prumo e o saber fazer do mestre Manuel Sousa, e a ajuda dos formandos”, disse.
O barco valboeiro é um elemento essencial na vida das comunidades ribeirinhas do Douro, de Melres à Ribeira de Abade, na freguesia de Valbom, e um símbolo da tradição fluvial do concelho de Gondomar, afirmando-se Artur Sousa convicto de que “no dia 01 de outubro, pelas 18:00, será feito o bota-abaixo, em Valbom, dia da Regata de Barcos Valboeiros”.
“Será o primeiro barco de um projeto que os quer devolver ao rio Douro, ao mesmo tempo que se motivam as entidades, contando com o apoio já do município de Gondomar e das uniões de freguesia de São Comes, Jovim e Valbom e Melres e Mêdas, bem como dos agrupamentos escolares de Valbom e da Beira-Rio, entre outras”, referiu.
O barco será entregue ao Grupo Etnográfico de Valbom que ficará responsável pela sua dinamização, explicando o promotor que os próximos passos serão revelá-lo “aos gondomarenses e a toda a população do rio”.
O promotor promete que o projeto será retomado no “próximo ano, num novo formato para construir mais barcos”.
Entre os mais entusiastas dos formandos, na sua maioria com mais de 50 anos, está Fernando Ferreira: “é assim que gostamos de trabalhar nele [barco], recorrendo às ferramentas mais básicas de carpinteiro, um machado, um serrote, martelo, pregos e pouco mais”.
“É garantido que quando for para a água estará pronto para navegar”, sublinhou Fernando Ferreira, que é ao mesmo tempo colaborador do mestre Manuel Sousa.
Muito atenta, de lápis e bloco de notas, a engenheira búlgara Desislava Kurteva observa cada momento da construção, quer aproveitar ao máximo a experiência de acompanhar a construção de um barco valboeiro.
“Gosto muito de coisas feitas à mão, de coisas que fazem parte do património dos países. Venho muitas vezes a Portugal, porque é o país do meu companheiro (…) e esta é uma oportunidade única para aprender como se faz um barco valboeiro. Gostava, no futuro, de construir um. Não sei se será tão grande, mas vou tentar. É muito importante aprender com os mestres”, explicou a engenheira, que está a trabalhar em Inglaterra, namorada com um português de Gondomar e guardou uma parte das férias para acompanhar a construção.
Utilizado durante séculos na pesca do sável e da lampreia e para o transporte de pessoas e de mercadorias, tradições que se foram perdendo com o avançar dos anos e das opções profissionais e de transportes, a presença de barcos no rio Douro está resumida a menos de uma dezena de exemplares.
Numa publicação na página da Internet do Turismo do Porto a Norte de Portugal é referido que no barco, na sua forma, se destaca “o grande lançamento da proa que avança quase em linha reta. Este pormenor destina-se a aguentar a rede usada na pesca do sável”.
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