Depois de quase 24 horas de chuvas intensas, o rio Taquari, que margeia o município, transbordou completamente. Klunk deixou o seu trabalho e, com água na altura da cintura, juntou-se a voluntários que evacuavam vizinhos das suas casas, na parte baixa da cidade.

"Apanhou-nos a todos de surpresa, não estávamos preparados. Com um plano, teria sido possível salvar [muitas] vidas", lamentou este homem de 52 anos, que trabalha com turismo. Pelo menos 51 pessoas morreram no Rio Grande do Sul por causa daquelas cheias. Sete continuam desaparecidas.

A dois mil quilómetros de Encantado, um grupo integrado por cientistas, funcionários do governo e ONGs começou a discutir num seminário, realizado no fim de setembro, em Brasília, como preparar o Brasil para mitigar os efeitos dos eventos climáticos extremos.

Diagnósticos apontam que os fenómenos que têm impactado  o país reiteradamente nos últimos tempos tendem a repetir-se.

Vulnerabilidade

Estima-se que no Brasil, 10 milhões de pessoas, distribuídas em 1.038 municípios - quase um quinto do total - estejam vulneráveis a eventos climáticos extremos, segundo o Centro de Monitorização e Alertas Naturais (Cemaden), um órgão federal.

"Temos que ter um sistema de alerta rápido, áreas de fuga. Como as pessoas vão proteger-se para não perder as vidas e ter o mínimo de prejuízo possível?", defendeu Marina.

A ministra assegurou que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva está a trabalhar para conter o avanço das alterações climáticas, por exemplo, reduzindo o desmatamento na Amazónia e, ao mesmo tempo, para se adaptar aos efeitos de um processo que "já está em curso".

O Brasil está "na vanguarda na procura de soluções de adaptação", afirma Jean Ometto, investigador do Instituto Nacional de Investigações Espaciais (Inpe).

O cientista coordena a ferramenta "Adapta Brasil", plataforma que mapeia todos os municípios e, processando bases de dados, determina o nível de risco frente aos eventos climáticos.

O sistema calcula, por exemplo, o risco de deslizamentos de terra e inundações, segundo fatores como características do terreno, tipo de urbanização e condição socioeconómica da população, explica Ometto.

A plataforma "é inovadora" e pode ajudar os líderes a agirem com base em "informações que têm densidade científica", afirma o especialista.

Manter a Amazónia de pé é chave para evitar novas catástrofes, afirma o cientista Carlos Nobre, estudioso da maior floresta tropical do planeta, co-vencedor do Prémio Nobel da Paz em 2007 como integrante da equipa de especialistas que compõem o Painel Intergovernamental de Alterações Climáticas (IPCC) da ONU.

No entanto, "há uma urgência gigantesca para que, além de mitigar as emissões, tornemos os brasileiros mais resilientes aos extremos climáticos", disse Nobre, ao qualificar como "inevitável" a repetição dos desastres.

"Campeão em prevenção"

Mami Mizutori, representante da ONU para a redução do risco de desastres, defende que os governos parem de "apenas responder" aos fenómenos climáticos extremos.

"Logicamente que as respostas são importantes, mas é preciso dar mais importância à prevenção. É preciso uma infraestrutura mais resiliente, diminuir a vulnerabilidade da sociedade e ter um bom sistema de governação", disse Mizutori à AFP, durante uma visita ao Brasil.

Mizutori mostrou-se otimista em relação ao país, destacando a luta de Lula contra "a desigualdade e a pobreza".

"O Brasil caminha para se tornar num campeão mundial na prevenção e na redução do risco de desastres", acrescentou a representante da ONU.