Qual é coisa, qual é ela, que pode ter a cor amarela, que sai dos lagares e dá prestígio à Beira Baixa? Pois é, não precisamos de mais charadas: é o azeite. O azeite é o ouro da região: tem a sua cor e, enquanto produto, também vale muito. Por isto, a Comunidade Intermunicipal da Beira Baixa (CIMBB), juntamente com parceiros da região, lançaram assim uma rota que pretende valorizar e promover este "produto icónico que mais nos distingue”, afirmou João Carvalhinho, secretário-executivo da CIMBB, no evento de lançamento do roteiro.

João Carvalhinho
João Carvalhinho, secretário executivo da Comunidade Intermunicipal da Beira Baixa créditos: CIMBB

A proposta é um roteiro de três dias – sem pressas, avisam os promotores – dividido pelos seis municípios que compõem esta região: Castelo Branco, Idanha-a-Nova, Oleiros, Penamacor, Proença-a-Nova e Vila Velha de Ródão. Desde caminhadas, visitas a lagares, provas de azeite até experiências gastronómicas nos restaurantes da região, são muitas as atividades ligadas ao azeite que pode fazer até ao final de janeiro. E não há desculpas porque, como frisou João Carvalhinho, “digam o que disserem não há gordura alimentar melhor do que o azeite”.

No evento de apresentação tivemos a oportunidade de ser dirigidos pelo chef Miguel Mesquita na recriação de dois pratos que homenageiam as gentes e histórias dos lagares: a tiborna e a lagarada. A tiborna, uma fatia de pão torrado regado a azeite, era um manjar para quem trabalhava muitas horas nesta lavoura; já a lagarada representa a velha e estreita relação do azeite com o bacalhau, que pode encontrar em vários restaurantes da região, e remonta a tempos antigos quando as refeições eram feitas nos lagares com o azeite acabado de ser produzido.

Na Beira Baixa, a variedade predominante é a azeitona Galega, autóctone da região, que  é uma das grandes responsáveis pela genuinidade dos azeites da Beira Baixa. Mas são também cultivadas as variedades Cobrançosa e Cordovil. O azeite, virgem ou virgem extra, é amarelo e pode ser levemente esverdeado. A variedade galega, principalmente, já madura traz doçura ao azeite e confere-lhe um sabor ligeiramente frutado, podendo conter notas de maçã.

DIA 1: PENAMACOR E IDANHA-A-NOVA

MANHÃ

A sugestão é começar o roteiro de manhã cedo em Penamacor. Aqui conhecerá a Beir’Aja: uma empresa criada pelos irmãos Marta e Samuel que migraram para a terra dos avós, onde encontraram um estilo de vida e modo empresarial com que se identificaram, promovendo uma série de experiências na região. Como a rota é do azeite, opte pela “Experiência da Azeitona”, na qual vai poder arregaçar as mangas e fazer todos os passos de produção do azeite, desde a colheita da azeitona, transporte para um lagar tradicional, que ainda labora, até à fase final em que há uma recriação de um típico farnel de quem trabalhava nos lagares: a tiborna.

Valor: 35€ por pessoa. Até aos 8 anos de idade é gratuito e dos 9 aos 16 aplica-se  50%  de desconto.

Duração: Aproximadamente 4 horas

Lotação: mínimo 2, máximo 6 pessoas.

Azeitona
Azeitona créditos: Lusa

Antes de sair de Penamacor, pode também visitar o Museu Dr. Mário Pires Bento ou a Serra da Malcata.

TARDE

A proposta é seguir para o município vizinho: Idanha-a-Nova. Aqui as sugestões são variadas, mas incluem sempre algum passeio. Pode começar por uma visita ao Lagar de Varas de Idanha-a-Nova. Os lagares de varas são lagares, da época romana, com um sistema de prensa em que se utiliza um tronco de uma árvore para comprimir a azeitona. Este lagar é um espaço retangular dividido em três salas onde se pode ver um pio de granito, circular, para a moagem da azeitona, com três galgas também de granito: o chamado poiso.

Saído do lagar, pode também visitar produtores e aproveitar para comprar alguns produtos, na Egitânia ou Coop.Agr.o.l.

Outros dos pontos de interesse que aqui pode encontrar são: o Complexo de Lagares em Proença-a-Velha ou a Aldeia Histórica de Monsanto, ambas as localidades fazem parte do concelho de Idanha-a-Nova.

Lagar de Varas em Idanha a Velha créditos: andarilho.pt

DIA 2: CASTELO BRANCO E VILA VELHA DE RÓDÃO

MANHÃ

O segundo dia desta Rota do Azeite da Beira Baixa convida-o a caminhar pela natureza através de percursos pedestres temáticos. Tem três percursos disponíveis: o PR7 Rota dos Lagares, o PR12 Rota dos Olivais e a Rota do Olival, em Malpica do Tejo. Os três são caminhos circulares, ou seja, o ponto de partida é o mesmo do ponto de chegada, o que o ajuda na logística de transporte.

O primeiro percurso – PR7 – levará o caminhante a conhecer antigos lagares de azeite. O ponto de partida é à frente da junta de freguesia de Almaceda. Esta rota está classificada com um nível dois de dificuldade (fácil), tem uma distância de 15 quilómetros e duração de 4h15min.

Almaceda
Almaceda créditos: andarilho.pt

Já o segundo leva-o para Ferrarias, freguesia de Sto. André de Tojeiras e o destaque vai para o Lagar do Carril. Esta rota de cerca de dez quilómetros fá-lo-á também passar pelos olivais tradicionais plantados em socalcos de xisto. O ponto de partida é Associação ARFO (Associação Cultural, Recreativa e Social Ferrarias e Outeiro), tem uma duração de cerca de 3h30min e o percurso está classificado com o nível três de dificuldade.

Por fim, o mais curto, a Rota do Olival. Tem aproximadamente nove quilómetros, duração de 2h30 e está classificada no nível dois de dificuldade. Ao longo desta rota o caminheiro poderá ver olivais onde se produzem as azeitonas Galega, Cordovil e Bical de Castelo Branco. Também têm a opção de visitar um lagar: o Lagar Cooperativo dos Olivicultores de Malpica do Tejo.

Em qualquer um dos percursos o silêncio e a comunhão com a natureza serão os pontos altos e os únicos sons que poderão interferir na caminhada serão o chilrear dos pássaros ou o correr da água da ribeira de Almaceda ou do rio Ocreza, dependendo do percurso que escolher.

Cascatas no rio Ocreza créditos: andarilho.pt

TARDE

A parte da tarde é dedicada a outra localidade: Vila Velha de Ródão. Aqui pode conhecer outro lagar de varas, o do Enxarrique. Este é um espaço museológico onde viajará pela história do fabrico do azeite. Depois de tanto caminhar por olivais e conhecer lagares, acreditamos que será um expert numa prova de azeite, mas antes deverá fazer a marcação no posto de turismo de Vila Velha de Ródão.

Lagar de varas em Vila Velha Ródão créditos: andarilho.pt

Completa a visita a este lagar, siga o percurso da ribeira até à foz, no rio Tejo, pelos passadiços. Atravesse a ponte e estará na capela da Senhora da Alagada, onde permanecem oliveiras com mais de 700 anos. Há uma lenda que reza que a Virgem apareceu no interior do tronco de uma oliveira. A imagem foi trazida pelas águas do rio Tejo, durante uma cheia. A imagem foi levada para a Igreja de Vila Velha de Ródão e voltava sempre ao tronco da oliveira. Isto aconteceu três vezes, até que cumpriram o desejo da Senhora e ergueram aqui uma capela em sua honra.

Pode também visitar o Museu Etnográfico e cultural do Ninho do Açor; o Núcleo Etnográfico da Lousa ou o centro histórico de Castelo Branco. Ficam ainda as sugestões de poder desfrutar de um passeio de barco às Portas de Ródão ou ainda pernoitar na Herdade da Urgueira, a qual  também dispõe de experiências relacionadas com o olivoturismo.

Portas de Ródão
Portas de Ródão créditos: CM Vila Velha de Ródão

DIA 3: OLEIROS E PROENÇA-A-NOVA

MANHÃ

É em Oleiros que pode despertar no terceiro e último dia do roteiro. A gastronomia, o desporto de natureza, as aldeias em xisto e as praias fluviais são os pontos fortes deste concelho. Pode visitar tudo isto e ainda os olivais e o lagar da Casa Fernandes. A visita terá início na Casa Elvira, com mais de 30 hectares de oliveiras apenas de azeitona galega, e depois segue para o lagar com mais de 60 anos onde a tradição e a inovação se encontraram. Histórias não vão faltar de quem faz deste ofício vida. No final poderá ter uma prova de azeites.

Casa Fernandes
Casa Fernandes créditos: Paulo Soares

TARDE

Com certeza que já ouviu dizer que “a água e o azeite não se misturam”. Na última proposta deste roteiro lança-se o desafio de perceber a razão através da ciência. Assim, faça uma paragem em Proença-a-Nova, no Centro Ciência Viva, onde poderá desfrutar de muitas experiências interativas. Esta é uma ótima atividade para se fazer em família.

Estas são sugestões integradas na Rota do Azeite, mas há muito mais para conhecer na Beira Baixa e pode aproveitar para prolongar a estadia para visitar as aldeias histórias, imergir na serra, explorar castelos ou apenas percorrer os miradouros, todos com paisagens absolutamente incríveis.

Prova de azeite: como se tornar um especialista

Antes de se fazer à estrada, o SAPO Viagens partilha consigo algumas dicas para a prova de azeite.

Ana Domingos, técnica da Associação de Produtores de Azeites da Beira Interior, foi quem nos abriu o apetite. “Fiz questão de ir aos lagares buscar azeite novo”, começa por dizer antes de iniciarmos a prova de dois tipos de azeite. A prova de azeite é uma das atividades incluídas no roteiro e uma experiência muito interessante, tanto para amantes do azeite, como para consumidores sem grande conhecimento sobre o tema.

Azeite
Azeite créditos: Pixabay

Como em qualquer prova, todos os sentidos têm de estar despertos, mais uns do que outros. O primeiro sentido é a visão: pedem-nos para olharmos e compararmos a cor de ambos os azeites. Confirmamos que um é mais amarelado e o outro, também amarelado, aponta mais para as tonalidades do verde.

Depois de o observarmos, pegamos no copo e aquecemo-lo um pouco na palma da mão, com movimentos muito subtis. Agora que ativámos o calor do mesmo, o olfato entra em ação. Ainda estamos na primeira amostra. “O primeiro azeite tem de cheirar a fruta”, avisa Ana. Não temos a certeza de ter conseguido decifrar o cheiro, mas seguimos para a melhor parte: a degustação. Entra o palato em cena. Deve-se deixar o azeite espalhar-se por toda a cavidade bocal e inspirar ar em simultâneo – para ativar as sensações retro nasais – e por fim deixar-se o azeite deslizar pela garganta. “Na língua vão perceber que o sabor é adocicado, percebe-se o aveludado do azeite, e não tem quase amargo nenhum. Quando abrir, passado algum tempo, na garganta podem sentir um ligeiro ardor”, explica ao mesmo tempo Ana. Check: conseguimos percecionar tudo! Próxima rodada, segundo copo de azeite.

Se o primeiro era azeite Virgem Extra, Galega exclusivamente, a segunda amostra é também Virgem Extra Galega, mas com variedades de Cordovil e Cobrançosa o que vai fazer toda a diferença na prova. Repetimos o processo inicial e apenas no último passo, no sabor, existem diferenças: o picante na garganta é mais presente. “Não se admirem se tossirem, faz parte”, diz Ana. Nem era preciso o aviso para rapidamente se ouvir no espaço uma espécie de sinfonia orquestrada de tosses contidas.

Diferentes marcas de azeite da Beira Baixa créditos: CIMBB

Estamos prontos para seguir o roteiro e aumentar a prova para mais amostras. Mas esta foi apenas a entrada para nos abrir o apetite para o banquete de histórias e experiências que podemos encontrar nos seis concelhos que compõem a Beira Baixa. O azeite será sem dúvida o fio condutor deste roteiro, que promete ser regado de memórias e temperado com muita paixão pelas gentes da terra. Mas deixemo-nos de metáforas gastronómicas e vamos fazer-nos à estrada até à região que se diz ser "onde nasce o sol e a felicidade". E quem é que não quer estar perto do sol e da felicidade?