Há dias assim. Em flores. Onde nos perdemos na natureza e percebemos quão bela e frágil ela pode ser. A rota das Amendoeiras em Flor da CP é um dia assim. É uma das rotas turísticas mais antigas da CP - chega este ano à 70ª edição - e, no final do dia, havemos de perceber porque é uma rota tão especial e porque ainda hoje continua a ser um verdadeiro sucesso. Havemos de lá chegar. Comecemos pelo início…

Dia 17 de fevereiro. O dia começa cedo. Ainda antes do sol nascer. Uma carruagem Schindler de 1ª classe aguarda-nos em S. Bento, no Porto, poucos minutos depois das sete da manhã. Espera-nos uma viagem de mais de três horas, até à estação ferroviária de Pocinho. É certo que o corpo se ressente de uma viagem tão longa. Tentamos encontrar a melhor posição na cadeira, pensamos em fechar os olhos, talvez ler um livro ajude. Mas não. Há, em paralelo, um rio que nos guia e que nos aprisiona. Os primeiros raios de sol sobre a água, o Alto Douro Vinhateiro, uma paisagem de cortar a respiração. Seguimos, com os olhos postos no horizonte.

Chegados a Pocinho, em Foz Côa, trocamos o comboio pelo autocarro e rumamos para o Museu de Foz Côa. A rota das Amendoeiras, uma parceria entre a CP e a autarquia de Foz Côa, pretende «promover a coesão territorial», com um conjunto de atividades propostas ao visitante.

Portanto, o Museu de Foz Côa é a primeira paragem desta rota. Somos diligentemente acompanhados por responsáveis do museu, que fazem questão de nos explicar a importância das gravuras do Côa para o território, e, com uma paciência infinita, nos explicam os animais representados, as técnicas usadas, os achados que o Museu alberga como o tesouro que são. Importa referir que as gravuras no Museu são réplicas das originais. Para poder ver as gravuras originais é necessário, com ou sem guia, partir à aventura, pelos vales e montes de Foz Côa. Ainda assim, as réplicas são um ótimo primeiro contacto com as gravuras e “abrem o apetite” para futuras visitas e caminhadas pelos trilhos, para chegar a ver as originais.

Hora de alimentar o corpo! A mente segue ainda entre cabras, bodes, auroques (boi selvagem) e cavalos. As técnicas e as gravuras, considerando a matéria-prima e os utensílios disponíveis, são impressionantes. Numa folha em branco, com um lápis HB, duvido que pudesse representar de forma tão fiel, as figuras do paleolítico, algumas delas com representações em movimento.

No centro da cidade de Vila Nova de Foz Côa celebra-se a 42ª edição da Festa da Amendoeira em Flor. As ruas estão preenchidas com barraquinhas onde não faltam os produtos regionais, produtos artesanais e doces típicos. Perdemo-nos entre a noz, a azeitona, o mel, as amêndoas e outros produtos endógenos.

Seguimos, de autocarro, do centro da cidade para a vila de Castelo Melhor. É lá que nos aguardam as mais belas amendoeiras em flor, em amendoais a perder de vista, com flores de um brando alvo e um branco escuro, de um rosa claro a um violeta intenso. Que vista fenomenal. Mesmo de perto, a beleza não se perde, com os detalhes das flores ladeadas pelas amêndoas que começam a nascer. Que privilégio! Percorremos o amendoal, atraídos por ramos carregados de flores, pelas pétalas cuidadosamente esculpidas, num campo onde são flores a perder de vista. Não vos disse que há dias em flor?

Diz-nos a responsável pelo Turismo da Câmara que as amendoeiras em flor são um acontecimento muito importante no Côa, não só pelo turismo que atrai, mas pelo que representa para a comunidade, desde sempre. A amendoeira em flor é um reinício, um recomeço, o sol que começa a quedar-se por mais tempo, a primavera que dá os primeiros passos. Como se pudessem, a partir dali, começar um novo ano. São essas possibilidades de recomeço que me invadem. Reiniciar é uma dádiva.

Voltamos para Pocinho. Espera-nos uma nova viagem de comboio, nas carruagens especialmente alocadas a esta rota. São mais três horas de viagem, desta feita, rumo aonde tudo começou. O rio continua a fazer-nos companhia, agora com os últimos raios de sol a dar-lhe vida. A paisagem continua a ser esplêndida. Mesmo no cansaço que teima em tomar conta do corpo, não podemos fechar os olhos. Mantêm-nos vigilantes as memórias de um dia cheio e a beleza do que a vista alcança.

A rota das amendoeiras em flor da CP segue nos próximos dois fins de semana - 24 e 25 de fevereiro, e, 2 e 3 de março - em passeios já esgotados.