Não dá para precisar quando a ideia desta viagem nasceu. Tiago Fidalgo e Joana Oliveira sempre tiveram um espírito do mundo. Naturais de Caldas da Rainha, foi no Brasil, durante uma experiência de intercâmbio, que começaram uma relação.

Formaram-se, casaram-se e a partir daí poderia começar a história típica e, muitas vezes, esperada pela sociedade: compraram uma casa, um carro e começaram a ter dias marcados de férias. Mas com Tiago e Joana, ambos de 26 anos, foi diferente. Decidiram que este era o momento ideal para realizarem uma grande viagem, uma experiência que iria mudar por completo as suas vidas.

“A ideia surgiu de uma forma natural”, conta Tiago, que já viajou pela América do Sul à boleia na altura em que estava a fazer intercâmbio. “Quando começamos a viajar juntos, ficávamos com a sensação de que queríamos mais, de que não tínhamos ficado tempo suficiente”, completa Joana.

O mundo na mão
Itália créditos: O mundo na mão

O desejo de partir à descoberta de novas culturas e países culminou com o plano de dar uma volta ao mundo. Ideia que foi sendo alimentada durante algum tempo até que chegou a data de partir: 2 de março de 2016. Com antecedência, avisaram as entidades patronais que iriam deixar o trabalho. Da parte das famílias, existiu algum receio, mas os amigos acharam muita piada, lembra o casal.

Estipularam que a viagem seria feita, sempre que possível, à boleia e a hospedagem seria feita através de couchsurfing (hospedar-se em casas de locais, amigos, conhecidos e amigos de amigos) ou teriam de dormir na tenda que levam na mochila. Para completar, Tiago e Joana são adeptos do veganismo (não consumir animais e produtos de origem animal) e tinham intenção de manter o seu regime alimentar durante a viagem.

Seis meses, 18 países, 22.434 quilómetros e 230 boleias depois, Joana e Tiago chegaram a Xangai (China), de onde conversaram, via Skype e Whatsapp, com o SAPO Viagens. A aventura completa pode ser acompanhada no blogue O mundo na mão.

Dificuldades, peripécias e muitas histórias bonitas

Demorar horas para conseguir uma boleia, ficar hospedados em casas de habitantes locais de aldeias remotas, surpreender-se com a hospitalidade de um país que parecia assustador, ultrapassar a barreira linguística. Estas são algumas experiências que têm marcado a viagem deste casal português.

Viajar à boleia
Grécia créditos: O mundo na mão

“Em Itália chegamos a estar sete ou oito horas no mesmo sítio à espera de uma boleia”, lembra Joana, considerando que a maior dificuldade desta viagem é mesmo o tempo prolongado de espera de uma boleia.

A barreira linguística poderia ser outra grande dificuldade, mas Tiago é um verdadeiro poliglota que, durante o tempo de estadia nos diferentes países, acaba por ir aprendendo algumas coisas, para juntar aos outros idiomas que já conhece, entre eles o polaco, o turco ou o russo.

Ainda assim, nem sempre é fácil explicar às pessoas que estão a viajar à boleia, de uma forma diferente da habitual, e os maiores sustos da viagem estão relacionados com apanhar boleias com pessoas que não confiam, o que acaba por criar um ambiente tenso. Um destes episódios aconteceu na Arménia, quando um condutor que os levava saiu da estrada principal durante a noite, o que foi motivo de alguma preocupação. “Não aconteceu nada, rapidamente voltou à estrada principal e deixou-nos onde estava combinado”, conta Joana.

Sustos e peripécias à parte, toda a viagem também está recheada de histórias bonitas, que reforçam a tese da bondade das pessoas em qualquer parte do mundo. Numa cidade antes da fronteira do Tajiquistão e do Quirguistão conheceram um senhor que se ofereceu para lhes guardarem as mochilas enquanto passeavam. No fim do dia, quando iam montar a tenda para passar a noite junto a um rio, o mesmo senhor avisou-os que aquele era um local um pouco perigoso, devido à subida das águas, e convidou-os para passar a noite em sua casa. “Era uma casa muito humilde, até com poucas condições, mas o senhor preparou-nos um banho típico, com lenha a aquecer a água, cozinhou para nós, foi ao quintal do vizinho buscar legumes, quando dissemos que não comíamos carne, e até preparou uma cama que tinha desmontada num quartinho”, descreve Tiago. “Foi uma experiência fantástica”, conclui.

Também na chegada ao Irão foram surpreendidos por uma atitude muito bondosa. Num momento tenso da viagem – cruzar fronteiras é-o quase sempre – e num país de que tinham ouvido opiniões opostas, acabaram por ser “extremamente bem recebidos na fronteira”. “O guarda fronteiriço falava turco, o que permitiu uma aproximação, e naquele momento fomos convidados a dormir na sala de reza feminina da fronteira”, conta Joana. “Num país em que os homens e as mulheres não podem andar juntos, onde há esta repressão associada à mulher, permitiram que nós os dois dormíssemos juntos numa sala de reza feminina. Foi duma generosidade tamanha”, sublinha Joana.

O mundo na mão
Irão créditos: O mundo na mão

Portugal também tem sido um bom cartão de apresentação para Joana e Tiago. “Por todos os países por que passamos até agora, o acolhimento tem sido genial face a sermos portugueses. Principalmente na Ásia central era uma loura, porque as pessoas conhecem o Ronaldo de uma forma inexplicável, aliás o Ronaldo já nos ‘desvencilhou’ em algumas situações chatas nas fronteiras e nas revistas”, recorda Joana.

Turquia e Irão foram os países mais marcantes até ao momento, numa rota que inclui os seguintes países: Espanha, França, Itália, Eslovénia, Croácia, Sérvia, Grécia, Turquia, Geórgia, Arménia, Irão, Turquemenistão, Uzebequistão, Tajiquistão, Quirguistão, Cazaquistão, China, Vietname, Camboja, Laos, Tailândia, Malásia, Singapura, Indonésia, Timor-Leste, Austrália, Nova Zelândia, Chile, Argentina, Bolívia, Brasil, Equador, Colômbia, Panamá, Costa Rica, Nicarágua, Honduras, Guatemala, México, Estados Unidos da América, Canadá, Portugal (Arquipélago dos Açores).

10 euros por dia

A estadia em cada país vai variando de acordo com os planos da viagem e com o tempo de duração dos vistos, de que vão tratando durante o caminho. O processo de conseguir os vistos “não é difícil”, mas, “além de caro, é chato, implica tempo e o preenchimento dos formulários e há sempre alguma tensão perante alguns países”, explica Joana. Para se ficar com uma ideia, dos 1300 euros que gastaram nestes primeiros seis meses de viagem, 700 euros foram para os vistos.

Tiago e Joana planearam gastar 10 euros por dia para os dois e têm conseguido manter o orçamento inicial. Além de viajarem à boleia e ficarem hospedados em casas de locais, não comem em restaurantes e tentam comprar comida em supermercados ou mercados locais.

O mundo na mão
Uzebequistão créditos: O mundo na mão

Têm também conseguido manter uma alimentação ovolactovegetariana. “Tivemos que beber leite uma vez porque foi aquilo que as pessoas que nos receberam nos ofereceram ao jantar, arroz cozido com leite. Mas não comemos carne, nem peixe, nem bebemos leite; derivados de leite e ovos consumimos esporadicamente”, diz Joana.

Viajantes e não turistas, Joana e Tiago encaram esta experiência como uma vida nómada e não uma viagem planeada, acabando por conhecer os sítios ao sabor dos dias e das pessoas que conhecem. “Mas também temos algumas atrações turísticas no roteiro, por exemplo, há bem pouco tempo um dos nossos objetivos era ir à Muralha da China e fomos”, conta Tiago. “Seguimos, muitas vezes, os conselhos das pessoas e acabamos por ir a locais menos turísticos ou nada turísticos, onde encontramos a verdadeira cultura e as verdadeiras pessoas, como é que elas vivem e como é que se relacionam com os estrangeiros”, salienta Tiago.

Viajar é possível

Entre os muitos objetivos desta viagem, um deles “é mostrar às pessoas que viajar é possível, basta ser criativo”, acredita Tiago. Claro que com isso não querem convencer toda a gente a viajar à boleia e a ficar na casa de outras pessoas, mas sim mostrar que “existem várias formas de viajar”.

O planeamento é um passo importante para se chegar onde se quer e permite poupar algum dinheiro, mas para Tiago existem três condições essenciais para se fazer uma viagem: “a energia, o tempo e o dinheiro”. São condições “interdependentes”. "Uma pessoa que tem pouco tempo e pouca energia tem que despender mais dinheiro, pois vai gastar mais em transportes; já uma pessoa que tenha mais tempo, para esperar uma boleia, e mais energia, para caminhar uma hora ou duas horas, vai despender menos dinheiro". “Tendo em conta estas condições e com algum planeamento existem milhares de opções de viagens”, defende Tiago.

O mundo na mão
Geórgia créditos: O mundo na mão

E o que pretendem retirar desta viagem? “É um processo, todos os dias estamos a retirar coisas novas e acredito que o Tiago e a Joana ao final de um ano e meio vão ser outras pessoas”, responde. “Mas nós não vamos dar por esta mudança e só no final, quando olharmos para trás, talvez possamos dizer ‘agora somos mais tolerantes, vemos o mundo com outros olhos’. Mas o processo é o mais importante”, conclui Tiago.

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