Dia 1: Descortinar o Funchal por terra e mar

Depois de uma aterragem tranquila no aeroporto do Funchal, o dia recebeu-nos nublado mas com algumas abertas. Uma das primeiras certezas que iríamos ter sobre a Madeira é que não há certezas no que diz respeito ao tempo. Podemos passar das nuvens para o quente do sol, da chuva para o céu azul em poucos minutos, principalmente durante o inverno e a primavera, já que no verão os dias ensolarados são uma constante. A temperatura amena, mesmo nas estações mais frias, é também uma agradável característica da ilha.

Mercado dos Lavradores e rua de Santa Maria

O Mercado dos Lavradores é uma ótima porta de entrada para começar a viagem pela Madeira. Aqui estão reunidos os principais sabores, cheiros e tradições da ilha. A exuberância das flores (proteas, estrelícias, antúrios, orquídeas) enche-nos a vista nas bancas da entrada principal, onde é possível observar painéis de azulejos produzidos na Fábrica de Loiça de Sacavém, que também decoram outros espaços do mercado.

Florista no mercado do Funchal
Mercado do Funchal créditos: Alice Barcellos

Entre as bancas, encontram-se muitos produtos da ilha: legumes, verduras e frutas. Um vendedor de maracujás dá a provar as variedades deste fruto. Estendemos a mão e saboreamos o doce e o ácido do maracujá roxo, de laranja, ananás, maracujá tomate – combinações várias de um dos frutos mais cultivados na ilha. Da terra para o mar, espada e atum ocupam um lugar de destaque nas bancas de peixe fresco. Em breve, iríamos descobrir que o peixe-espada é um dos protagonistas da gastronomia madeirense.

Saímos do mercado e seguimos pela rua Santa Maria, uma das principais artérias da zona velha do Funchal e que ganhou uma nova vida com o projeto Arte de Portas Abertas. O movimento começou em 2010 e hoje várias portas de edifícios desta zona da cidade são obras de arte, feitas por artistas e artesãos. Muitas convidam a uma paragem para uma fotografia, momento que deve ser registado durante o dia, já que durante a noite a rua transforma-se: as portas pintadas abrem-se, dando lugar a bares e restaurantes, responsáveis pela nova movida da noite funchalense.

Teleférico, Monte e cestos

Mais tarde teríamos a oportunidade de conhecer o Funchal depois do pôr do sol, mas agora é altura de caminhar mais alguns metros em direção a outro passeio obrigatório na cidade. Entramos numa das cabines do Teleférico do Funchal e, durante 15 minutos, temos uma vista de 360 graus da cidade. Ao longo de um percurso de mais de 3 quilómetros, enquanto subimos 560 metros, é possível observar a mudança de cenário. A malha urbana dá lugar às casas construídas nas encostas, com jardins e terrenos cultivados. Até que chegamos à freguesia do Monte. O ar puro, o clima mais fresco e a envolvência verde fazem com que este local seja conhecido como a Sintra do Funchal.

Teleférico do Funchal
Teleférico do Funchal créditos: Alice Barcellos

Parque Municipal do Monte, Igreja da Nossa Senhora do Monte e Jardim Tropical Monte Palace – este último propriedade da Fundação Joe Berardo – são locais a ter em conta. Caso tenha pouco tempo, pode começar já a pensar em descer para o centro do Funchal, utilizando um meio de transporte fora do vulgar: o carro de cestos.

É uma tradição que remonta ao século XIX, quando os abastados, donos de quintas no Monte, desciam até ao centro nestes carros de cestos. Hoje, esta espécie de trenó feito em vime e madeira é uma atração que chama milhares de turistas, eleita pela CNN Travel como um dos sete meios de transporte mais “cool” (fixes) do mundo. São dois quilómetros até à localidade do Livramento, numa descida vertiginosa em que o cesto desliza pelo alcatrão, conduzido por dois carreiros que, com perícia, controlam o percurso, travando o cesto com botas de sola de borracha – a mesma utilizada nos pneus dos carros. Mais do que uma profissão, ser carreiro é um estilo de vida, que se começa a aprender a partir dos 17 ou 18 anos.

Carros de cestos
Descida nos carros de cestos créditos: Alice Barcellos

Observação de cetáceos

Depois de uma manhã com, literalmente, altos e baixos, escolhemos o local para almoçar já a pensar no programa que iria ocupar a tarde: observação de cetáceos. Na Marina do Funchal, existem várias operadoras de passeios de barco que dão a conhecer a riqueza da vida marinha da ilha. Embarcámos no catamarã da VMT para uma viagem com cerca de três horas. A expectativa era avistar golfinhos, baleias e tartarugas, mas não é certo que se consigam observar todos os animais. Fomos brindados por momentos mágicos com golfinhos roazes e golfinhos comuns. Os simpáticos mamíferos são uma presença quase certa em todas as viagens, interagindo com os barcos que fazem este percurso.

Golfinhos na Madeira
créditos: Alice Barcellos

No regresso ao Funchal, observa-se o recorte da ilha, com escarpas e grutas incrustadas. O Cabo Girão mostra toda a sua grandiosidade quando observado do mar, uma perspectiva única do promontório mais alto da Europa, que se precipita sobre águas de um azul escuro brilhante. É impossível terminar este passeio de barco sem um sorriso no rosto e, para os mais desprevenidos, com algum frio. Nos dias mais nublados e ventosos, é importante não esquecer o casaco, embora sejam fornecidas mantinhas para os mais friorentos. Já nos dias de verão, é permitido saltar do barco e nadar com os golfinhos. Teria coragem?

Dia 2: aventura na montanha

Neste segundo dia, seguimos em direção ao Parque Ecológico do Funchal, que ocupa uma área verde e montanhosa a norte da cidade, entre os 470 metros de altitude na ribeira Santa Luzia e os 1818 metros de altitude no pico do Areeiro. É possível tirar maior partido da beleza natural da Madeira através de várias atividades. Por toda a ilha existem percursos pedestres assinalados e muitas empresas realizam caminhadas. Mas há outras opções, como passeios de Jeep, BTT ou canyoning.

Canyoning na ribeira das Cales

O canyoning promete emoções fortes e uma imersão única na natureza. É uma modalidade desportiva que consiste em explorar um rio ou uma ribeira, ultrapassando obstáculos – quedas de água, rochas ou lagoas – através de diversas técnicas – rappel, saltos ou nado. E foi nesta aventura que embarcámos, com a ajuda preciosa dos guias da empresa Adventure Kingdom.

Partimos de uma altitude 1470 metros e, durante cerca de duas horas, percorremos um 1km e cerca de 150 metros de desnível na ribeira das Cales. A temperatura da água estava entre 5 e 8 graus, mas com os fatos isolantes isso não é um problema. Esta modalidade pode ser praticada por quase toda a gente, uma vez que o nível 1 apresenta obstáculos fáceis e moderados, havendo sempre a opção de contorná-los por outros caminhos. Mesmo assim, para quem pratica pela primeira vez, é uma experiência de adrenalina e algumas vertigens. Nada que não seja ultrapassado e recompensado por um percurso marcado por cenários únicos.

Floresta Laurissilva

A beleza natural continua a surpreender no caminho em direção ao Norte da ilha, onde se encontra o verde vibrante da Floresta Laurissilva, considerada património natural da humanidade pela Unesco. O viveiro de trutas de Ribeiro Frio é ponto de paragem para quem segue por ali. Uma atração turística à face da estrada com piscinas naturais utilizadas na criação deste peixe de água doce. Também existem alguns trilhos assinalados para caminhadas junto às levadas, outro símbolo da ilha da Madeira.

Floresta Laurissilva
Viveiro de trutas de Ribeiro Frio créditos: Alice Barcellos

Percorremos as estradas serpenteadas da freguesia de Santana até chegar à Quinta do Furão, hotel numa propriedade vinícola com vistas imperdíveis de montanha e mar. O restaurante da quinta é uma boa opção para almoçar. Os pratos do chef Rui Vieira foram uma das experiências gastronómicas mais marcantes desta viagem.

Casinhas de Santana e Cristo Rei

Depois do almoço, fomos ver um dos bilhetes postais da Madeira: as casa típicas de Santana. De forma triangular e telhado feito de colmo, estas construções foram, noutros tempos, muito populares na ilha. Hoje em dia, são em número reduzido. Mas no Núcleo de Casas Típicas de Santana, junto à Câmara Municipal, é possível encontrar exemplares bem conservados, integrados num jardim cheio de flores.

Casinhas de Santana
Casinhas de Santana créditos: Alice Barcellos

Antes de regressar ao Funchal, uma paragem no Cristo Rei da Ponta do Garajau, em Caniço. O monumento religioso, inaugurado em 1927, é também um miradouro que permite observar o Oceano Atlântico, as Ilhas Desertas, a Reserva Natural do Garajau, parte da baía do Funchal e o Caniço de Baixo.

Noite no Funchal

A Zona Velha do Funchal ganha outra vida num sábado à noite e foi lá que terminámos o segundo dia de viagem. O restaurante do Hostel Santa Maria, que conjuga requinte e descontração na perfeição, foi o local escolhido para jantar. Na Venda Velha, também na rua Santa Maria, acabámos a noite com uma poncha. Para muitos, a noite estava apenas a começar, numa cidade que conta com uma oferta de bares e discotecas para todos os gostos.

Dia 3: Centro do Funchal e Fajã dos Padres

O terceiro e último dia de viagem começou com uma volta pelo centro do Funchal – a melhor maneira de o fazer é a pé. São vários os pontos de interesse desta zona nobre da capital madeirense: Sé Catedral, Igreja do Colégio, Largo do Município, estátua de Gonçalves Zarco, Museu de Arte Sacra, entre outros. Numa preguiçosa manhã de domingo, ainda com pouco movimento pelas ruas do centro, parámos para tomar uma bica no Café do Teatro – o chão recém lavado indicava que a noite tinha sido longa no espaço que também funciona como discoteca.

Centro do Funchal
Centro do Funchal créditos: Alice Barcellos

É aqui na Avenida Arriaga que acontecem alguns dos momentos altos da Festa da Flor, com os seus tradicionais e coloridos tapetes de flor, além do Cortejo Alegórico. Uma festa que faz jus ao nome de jardim do Atlântico, pelo qual a Madeira também é conhecida, e que afirma a relação secular que este povo tem com a natureza e com a agricultura.

Num território que se divide entre escarpas, encostas, montanhas, vales e baías, com poucos locais planos, os madeirenses aproveitam qualquer pedaço de terra para cultivar. As bananeiras e a cana de açúcar enchem os socalcos da ilha, mas há um local que reúne vários géneros agrícolas e que ainda conserva um lado quase intocável. É a Fajã dos Padres e é para lá que seguimos. Pelo caminho uma paragem clássica no Miradouro do Cabo Girão. Na plataforma suspensa de vidro têm-se vistas panorâmicas sobre o oceano e os municípios de Câmara de Lobos e do Funchal.

Fajã dos Padres

A quinze minutos de carro do Funchal, a Fajã dos Padres é uma faixa de terra baixa e plana, resultado de uma derrocada – na Madeira esta característica geológica é chamada de fajã. Por ter pertencido aos Jesuítas durante mais de 150 anos, ficou conhecida como Fajã dos Padres. Espremida entre a encosta e o mar, a fajã encontra-se mais resguardada e apresenta um clima mais quente.

Fajã dos Padres
Vista para Fajã dos Padres créditos: Alice Barcellos

Localizada no sopé de uma encosta de 280 metros, do lado direito do Cabo Girão, só é acessível através de uma descida vertiginosa de quatro minutos e 250 metros através do elevador da Quinta Grande ou de barco. Em breve, vai ser inaugurado um teleférico, que vai acabar por levar mais pessoas a este pequeno paraíso de solo fértil e mar azul que desenrola suavemente numa praia de calhaus rolados e areia preta.

A fajã continua a ser um local pouco explorado pelos turistas que visitam a ilha. Mário Jardim Fernandes é o proprietário da quinta, comprada pelo avô da sua mulher em 1921. Desde então, a propriedade rural já passou por vários momentos, chegando mesmo a estar quase abandonada. Hoje em dia, é uma exploração agrícola biológica que tem de tudo um pouco: das couves às papaias, das alfaces às mangas.

A herança mais preciosa deixada pelos Jesuítas foi a introdução da casta malvasia na fajã, que produziu um vinho cuja reputação ultrapassou as fronteiras de Portugal, e chegou até à Inglaterra, Estados Unidos e Rússia. Depois ter sido quase exterminada dali, Mário, um apaixonado pela terra, conseguiu reintroduzir a malvasia na fajã e convidou-nos a experimentar um vinho Madeira de 2001, conservado na adega da propriedade.

Fajã dos Padres
Fajã dos Padres créditos: Alice Barcellos

As antigas casas da quinta foram recuperadas e funcionam como alojamento turístico. Na Fajã dos Padres existe ainda um restaurante que serve pratos da gastronomia tradicional madeirense, sempre acompanhados dos produtos produzidos na ilha. Depois de um almoço de peixe-espada com banana frita e de saborear a frescura da papaia, banana e pitanga, concluímos que a nossa despedida da Madeira não poderia ter sido feita de melhor forma. Foi, com certeza, um até breve e não um adeus.

O SAPO Viagens viajou a convite da Associação de Promoção da Madeira. Para mais informações, visite o site oficial do Turismo da Madeira.

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